Combustíveis, taxas de câmbio e o Big Mac Index

Em termos económicos, o ano 2015 foi dos mais difíceis para os angolanos. Para fechar o ano o Governo de Angola e o BNA resolveram dar um presente amargo aos angolanos, enfatizando assim que, em princípio, 2016 não será melhor.

No último dia de 2015 foi anunciado o fim dos subsídios ao preço do gasóleo e o aumento dos preços da generalidade dos derivados de petróleo. A variação dos preços foi justificada por ajustes nos subsídios e pela actualização da taxa de câmbio oficial que passou para 155,6 kwanzas por cada dólar americano.

O gasóleo passou a custar 135 kwanzas por litro e a gasolina passou a custar 160 kwanzas por litro, os aumentos foram de 80% e 39% respectivamente. O custo com a aquisição de gás butano e petróleo iluminante foi igualmente agravado, o mesmo ocorreu com o combustível usado na aviação, o que permite antever uma subida generalizada nos custos de transporte em Angola.

Ademais, como as necessidades de electricidade da indústria angolana são grandemente suportadas por geradores, o aumento dos custos com combustíveis terá reflexos nos custos operacionais que deverão ser passados para os clientes parcial ou integralmente. Mais inflação à vista.

precPetroleo

Os 160 kwanzas por litro de gasolina que os angolanos pagam agora equivalem a 0,99 dólares*. Considerando a lista publicada pelo site Global Petrol Prices reportada a 28 de Dezembro de 2015, a nossa gasolina é hoje 9% mais cara que no Brasil e 23% mais cara que na África do Sul.  Comparando com a Arábia Saudita que aumentou recentemente o preço da gasolina mas manteve parte do subsídio, a nossa gasolina é 316% mais cara e se olharmos para a Nigéria que a 1 de Janeiro deste ano deixou de subsidiar o preço da gasolina pagamos 130% a mais por cada litro de gasolina. A Nigéria é um bom ponto de referência pois tal como nós é um produtor africano que colmata o défice de refinação interna com importação de produtos refinados e tem um preço livre de impostos sobre o consumo (nós ainda não aplicamos o imposto apesar de existir já legislação aprovada).

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Estando o preço da gasolina sob o regime de preço livre há algum tempo, parece contraditório que continue a aumentar quando a matéria-prima de base está em queda há meses. Uma das justificações avançadas pelo MINFIN para o “reajuste do preço dos combustíveis” foi a alteração da taxa de câmbio de referência do BNA, pelo que, esta taxa também terá influenciado o aumento dos preços da gasolina (preço livre) embora que 39,1% de aumento supera largamente os 15% de desvalorização do kwanza.

Aparentemente a Sonangol procurou reflectir no preço da gasolina outros custos que terão aumentado mas estes eventuais custos adicionais não foram especificados pela empresa. Outra hipótese poderá ser uma antecipação de nova alteração na taxa de câmbio no futuro próximo.

Com efeito, usando a teoria do preço único; (i) considerando a gasolina como único produto do nosso cabaz, (ii) admitindo o pressuposto simplificador que a gasolina de Angola é igual à dos Estados Unidos e (iii) recorrendo ao método (simplista e simpâtico) da revista The Economist para o cálculo do The Big Mac Index para definição da posição de uma moeda em relação ao dólar dos Estados Unidos, chega-se a conclusão que o kwanza continua sobrevalorizado em relação ao dólar americano e teria que deslizar mais 66,7% para ter uma taxa de câmbio equilibrada, ou seja, a taxa de câmbio ideal seria 266,7 kwanzas por cada dólar**. Como mencionei aqui, o Standard Bank estima uma taxa de câmbio USD/AOA média de 192,3 para este ano, sendo que para o final do ano o Standard Bank estima uma taxa de câmbio USD/AOA de 235. Pois é, a coisa pode piorar.

* para calcular este valor usei a taxa de câmbio estimada da banca comercial: 160,3 (taxa BNA+3%).

** considerando 160 kwanzas por litro de gasolina em Angola e 0,6 dólares por litro nos EUA e dividindo o preço em Angola pelo preço nos Estados Unidos chega-se a uma taxa de câmbio de 266,7.

 

Book Club | “The Frackers – The Outrageous Inside Story of the New Billionaire Wildcatters”

the frackersGregory Zuckerman é um daqueles autores com um talento especial para escrever a história como se de um romance se tratasse, o autor de “The Greatest Trade Ever”, livro que descreve a elaboração e execução da estratégia de John Paulson e seus colaboradores na maior transacção de sempre que tirou proveito do colapso do mercado imobiliário dos Estados Unidos, abraçou em “The Frackers” a história dos pioneiros da exploração de petróleo e gás para lá das rochas de xisto. Em boa verdade, o homem sabe há muitos anos da existência de hidrocarbonetos em “armadilhas” de rochas (o nome “petróleo” significa “óleo da pedra”) mas a insistência de um grupo de empreendedores americanos foi o primeiro capaz de explorar com sucesso comercial as riquezas abaixo das camadas de xisto.

“The Frackers” começa por contar a história de George Mitchell cuja empresa foi pioneira a usar a tecnologia de fracturação hidráulica das rochas (hydraulic fracturing) para exploração de gás na formação rochosa do Barnett no norte do Texas. A persistência de mais de uma década de Mitchell no aperfeiçoamento da tecnologia permitiu a revolução energética mais recente nos Estados Unidos com efeitos em todo o mundo.

Gregory Zuckerman não foca a sua narrativa apenas na tecnologia e nos efeitos económicos da revolução do shale gas mas também na personalidade das pessoas que levaram a cabo a revolução como Aubry McCLendon e Tom Ward da Chesapeake Energy; Harold Hamm da Continental Resources que protagonizou mais tarde o divórcio mais caro da história dos divórcios dos Estados Unidos; o imigrante libanês Charif Souki que abandonou o negócio da restauração para lançar-se num terminal de importação de LNG que com a abundância de produção americana foi convertido em terminal de exportação de LNG; Mark Papa que transformou a EOG Resources (antiga filial da falida Enron) num operador de referência depois de ter mantido em segredo o que tinham descoberto na formação rochosa de Eagle Ford no sul do Texas e Robert Hauptfuhrer da Oryx Energy.

O livro conta a história dos últimos 20 anos de exploração de petróleo e gás nos Estados Unidos que foram marcados por maior investimento da produção no exterior por parte das grandes empresas, uma vez que existiam várias restrições locais para aumento das zonas de exploração no offshore. Neste contexto, as empresas menores decidiram apostar em formas alternativas de aceder às riquezas no subsolo arriscando milhares de dólares em experiências tecnológicas que acabaram por revelar-se revolucionárias. As grandes empresas perderam corrida e tiveram que recorrer mais tarde às aquisições para terem acesso ao bolo do xisto cujo aumento da produção afectou a oferta mundial e ajuda a explicar a actual depressão do preço do petróleo que tem provocado grandes constipações deste lado do globo.

“The Frackers” é a todos níveis um livro obrigatório para quem quer familiarizar-se com o que está por trás da exploração de petróleo e gás em formações rochosas mas também ajuda-nos a perceber porquê que certas revoluções tecnológicas acontecem sobretudo nos Estados Unidos. Os americanos ao longo da sua história parecem ter conseguido criar o ecossistema perfeito para empreendedores, onde as grandes ideias encontram os financiadores, técnicos e protecção judicial para as suas arriscadas apostas no desconhecido.

Título: “The Frackers The Outrageous Inside Story of the New Billionaire Wildcatters” | Autor: Gregory Zuckerman