As eleições de 2022 e o baixo nível de discussão

No próximo dia 24 de Agosto os angolanos estão convocados para eleger um novo presidente e uma nova configuração da Assembleia Nacional. O país é uma coleção de problemas e neste período de campanha eleitoral os partidos e seus cabeças de lista poderiam fazer um trabalho melhor em como pretendem transformar o país.

O período eleitoral é comummente referido na comunicação social como a “festa da democracia” e este espírito poderá estar a ser levado ao extremo do literal pelos partidos que parecem dedicados à carnavalização da democracia, apostando numa comunicação dominada por cartazes “vazios” e infestação de ruas com bandeiras.

Como em qualquer parte do mundo, o eleitor comum não lê manifestos eleitorais e o conhecimento dos programas é feito sobretudo por espaços dos partidos na rádio e televisão e como estes meios cobrem os eventos de campanha dos partidos, nomeadamente os comícios. No campo da cobertura mediática as nossas televisões continuam a pautar pelo desequilíbrio com tempo de antena favorável ao MPLA e programas de opinião única, sem direito a contraponto.

O contraponto em campanha eleitoral nas democracias atinge o seu auge quando os protagonistas debatem e são forçados a convencer as pessoas dos seus projectos, preparação e conhecimento mais detalhado das suas promessas com contraditório imediato que se diferencia dos monólogos que caracterizam os comícios e o tempo de antena. Infelizmente, mais uma vez não tivemos debates presidenciais, em particular entre João Lourenço e Adalberto Costa Júnior que lideram os projectos que dominam as intenções de voto de acordo com as sondagens que têm estado a ser publicadas há alguns meses pelo Movimento Cívico Mudei.

Seria importante ver o líder da UNITA a ser questionado sobre o que se pretende com a “consagrar a terra como propriedade ancestral” ou como pretende (e com que prazo) aumentar o salário mínimo da função pública para 150 mil kwanzas.

O não debate não nos permitiu também que o presidente João Lourenço fosse confrontado com flagrantes insuficiências do seu primeiro mandado, como por exemplo (i) a não realização de eleições autárquicas, a (ii) a contínua crise económica e degradação generalizada do nível e vida, (iii) a reversão do controlo sobre a comunicação social relevante e a (iv) ocorrência de incidentes de violência policial em manifestações que resultaram em mortes de cidadãos nacionais.

Contudo, há a registar a apresentação de veios condutores dos projectos de governação nos comícios, como a promessa de revisão constitucional de Adalberto Costa Júnior ou o aumento contínuo da contribuição na economia dos sectores não directamente ligados ao petróleo até 80% como prometeu o MPLA na busca da diversificação efectiva da economia angolana.

A utilização dos cartazes está muito longe do que eu esperava para uma campanha em 2022 num país com tantos problemas. A generalidade dos partidos comunica mal com cartazes, reduzindo a sua mensagem ao fenómeno do “vota no número tal”, sem apresentação de qualquer ideia que faça merecer o voto, incluindo partidos recém-criados cuja ideologia é desconhecida da maioria dos eleitores.

Em parte, o “vota no número tal” é uma manifestação da forma como os partidos olham para os eleitores que são por estes vistos como pouco sofisticados e, por esta razão, mais facilmente votam num número por insistência da mensagem do que numa proposta concreta num cartaz ou mesmo numa referência da promessas não cumpridas pelo incumbente como é comum noutras geografias, em particular onde não existe voto electrónico e a digitação do número no momento da escolha não é necessária.

Contudo, apesar do nível de acesso estar longe do ideal, podemos dizer que com recurso à Internet vamos conseguindo acompanhar a campanha com maior amplitude do que no passado pese o facto de se manter intacto o desequilíbrio no tratamento dos concorrentes por parte da comunicação social pública que tem uma inegável inclinação para amplificar a mensagem do MPLA.

Espero que nos próximos pleitos a transparência e confiança no processo deixe sejam boas o suficiente para que o discurso da desconfiança deixe de fazer sentido que a comunicação seja melhor e focada na discussão do presente e do futuro de Angola com um olho nos feitos e desfeitos do passado.

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E o debate?

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Estamos quase a chegar ao dia da eleições gerais em Angola e ao que parece não haverá mesmo debate entre os candidatos a Presidente da República. Em 2017, num país com tanto para discutir, segundo consta, o candidato do MPLA não está muito interessado em debater ideias com os seus adversários.

Em termos globais a campanha eleitoral resumiu-se a comícios, intervenções nos tempos de antena reservados na rádio e televisão, momentos deprimentes de suposta pedagogia do voto em que os candidatos tratavam os eleitores como criancinhas, afixação de bandeiras e eventos populares com música da moda regados a cerveja.

Os tempos de antena deram para ver e ouvir muitas propostas, uma esquisitas, algumas utópicas e muitas delas até interessantes e todas poderiam ser aprofundadas se debatidas entre os proponentes mas não houve debate. As candidaturas nem exploraram o suficiente os encontros interactivos com a sociedade, no estilo do que os americanos chamam de Town Hall meetings que permitem ao cidadão comum fazer perguntas directamente aos candidatos, vi imagens de um encontro próximo deste estilo com o Isaís Samakuva da UNITA num cinema em Benguela, do MPLA vi vídeos captados com telemóveis de um aceso encontro entre estudantes do ISPTEC em Luanda e representantes do MPLA mas nada feito como produto televisivo para maior abrangência.

Seria positivo vermos os candidatos a debater ideias de como será combatida a corrupção, frases preparadas para comícios e entrevistas não chegam, seria bom ver os candidatos confrontarem-se com dúvidas e objecções, perceber como a UNITA defenderia o salário mínimo de 83 mil kwanzas e as posições dos outros sobre o salário mínimo, como o MPLA chegou ao número de 500 mil empregos e o quais são os pontos a melhorar e a corrigir, qual é o plano do Quintino Moreira para criação de 1 milhão de empregos e três capitais, como o PRS defende o federalismo como solução para muitos dos nossos problemas, como a CASA CE defenderia o objectivo de erradicação da pobreza extrema numa década e como a FNLA pretende fazer uma reforma agrária.

Como país, temos que exigir mais de nós e dos nossos e não podemos ter uma campanha eleitoral em que no lugar de outdoors com propostas de governação temos apenas uma a distribuição carnavalesca de bandeiras e banners a imitar um boletim eleitoral com um “x” no quadrado do partido que o afixou. Passa a ideia que os eleitores devem olhar para os partidos como se fossem clubes de futebol, que devem ser apoiados nos momentos altos e baixos e pouco interessa o que fizeram e o que se propõem a fazer.