Há 21 anos – no dia 4 de abril de 2002 – os representantes das forças armadas regulares de Angola (FAA) e do braço armado da UNITA (FALA) assinaram em Luanda o acordo que formalizou o final da longa guerra civil que acompanhou Angola desde o seu nascimento como nação independente em 1975 até àquele momento no princípio do século XXI. O 4 de Abril, hoje conhecido como “dia da paz” é provavelmente a segunda data mais importante de Angola independente e partilha como o 11 de Novembro, a data mais importante, o marco zero de um momento alicerçado na esperança colectiva.
Infelizmente, tal como 11 de Novembro, a realidade dos angolanos contrasta com as expectativas da maioria e com os discuros daqueles que se espera serem os fiés garantes da correcta execução das políticas que elevariam os angolanos da condição de humilhados para protagonistas de uma história de sucesso contínuo e abrangente
A não materialização da esperança dos angolanos é palpável e torna datas comemorativas como o dia 4 de Abril em dias que relembram os angolanos que o que lhes tem vindo a ser prometido continua por se materializar. O país continua longe de ser uma democracia funcional e a economia continua ancorada no sector petrolífero apesar de alguns avanços no caminho da diversificação.
No ano 2000 o PIB per capita corrente em Angola era de aproximadamente 700 dólares, valor que crescia para cerca de 3,1 mil dólares se considerarmos o paridade do poder de compra. Naquele ano, o preço médio do petróleo não chegou aos 30 USD/barril. O fim da guerra deu início ao período dourado do crescimento económico vertiginoso que foi suportado pela expansão da actividade económica não-petrolífera e, sobretudo, pelo crescimento da produção do petróleo (na sequência de investimentos feitos nos anos 1990 quando ainda havia guerra) num contexto de aumento contínuo do preço médio do petróleo.

O crescimento económico tem sido ditado pelo crescimento do sector do petróleo e a primeira década de paz efectiva coincidiu com a forte expansão do sector petrolífero que teve uma breve interrupção com a crise financeira de 2008 mas continuou a sustentar o crescimento do PIB angolano até 2014, ano em que o preço médio do barril do petróleo iniciou uma queda violenta. O
coprotamento do sector petrolífero veio lembrar todos que vivíamos uma fantasia e que a década dourada estava a ser desaproveitada.
Angola não investiu com qualidade na recuperação e aumento das infra-estruturas, de tal forma que estamos em 2023 e o novo aeroporto internacional de Luanda continua por inaugurar e não existem estradas de qualidade para ligação terrestre entre todas as províncias, a desorganização urbana de Luanda que alimenta calamidades na sequência de fenómenos naturais extremos é igualmente exemplo de falta de investimento nas infra-estruturas.
O investimento em educação que deveria contribuir para melhorar a produtividade transversal da nossa economia foi sempre negligenciado e as mudanças institucionais que poderiam transformar o nosso sistema político e o tornar mais alinhado com as demandas comuns também não aconteceram e em 2023 continuamos com o mesmo modelo de governação local e eleições autárquicas continuam a ser uma incógnita.
Para construção de uma nação é importante ter presente que a paz deve ser aproveitada para realizar o potencial social e económico da nação e este país iniciou em 2014 um processo de empobrecimento que não tem sido suficientemente discutido e a recuperação económica recente – que mais uma vez segue o ritmo do petróleo – não foi ainda suficiente para que as famílias se aproximem nos níveis de vida da década anterior e não tem evitado o sentimento generalizado de perda de esperança no futuro de Angola que continua atrelada ao petróleo apesar das reformas no sentido de redução desta teimosa dependência do petróleo, que teve os primeiros sinais mesmo antes da independência (como falámos aqui) e foi agudizado pela descalabro das políticas económicas centralizadoras do pós-independência que combinadas com a guerra civil destruíram o tecido produtivo tanto na agricultura como na indústria transformadora.
Em resumo, os altos e baixos da nossa economia continuam a ser uma função do sector petrolífero porque toda dinâmica de crescimento está acoplada à capacidade do Estado realizar receita fiscal petrolífera para suportar o consumo público que é ainda um motor indispensável para outros sectores crescerem, incluindo o de serviços. As makas com o défice de formação de qualidade e infra-estruturas adequadas encarecem a produção nacional e reduz a capacidade de nos afirmarmos como um exportador diversificado de produtos manufaturados e agro-pecuários, apesar do custo relativamente baixo da mão-de-obra.
Os programas de iniciativa pública que visam diversificar o tecido produtivo são quase sempre focados em soluções de financiamento e não é visível a implementação de um programa transversal que ataque os problemas que afectam o custo de produção e a produtividade e por esta razão, o impacto dos diferentes programas é limitado e ao fim de 201 anos de paz, incluindo uma década com ventos mais do que favoráveis, continuamos a ter uma economia impotente que tem no petróleo o seu maior estimulador.