Ao contrário de muita gente eu sou daqueles que pensa que os atletas ainda são o melhor do desporto angolano, é verdade que a selecção nacional de futebol põe esta minha convicção em causa muitas vezes, mas para mim o problema maior do nosso desporto reside na gestão deficiente das instituições desportivas em Angola, quer as instituições reitoras quer os clubes. Uma das falhas visíveis das nossas federações e dos nossos clubes é a sua incapacidade de atrair patrocinadores privados para financiar as suas actividades e projectos o que torna o nosso desporto dependente do sector público, quer seja a administração pública via ministérios ou as empresas de domínio público.
A situação já foi pior, nas principais competições nacionais – o Girabola e o agora BIC Basket – já é possível vislumbrar muitos logótipos de entidades privadas mas há mais por fazer porque o potencial está longe de ser esgotado. Melhor organização, pessoal melhor formado e maior espírito de sustentabilidade podem gerar resultados no curto prazo.
No mundo moderno, os patrocinadores procuram ser sobretudo parceiros, buscam ser parte de uma associação benéfica para ambas as partes, nesta relação o clube recebe os fundos que serão utilizados na sua actividade corrente ou investimentos e o patrocinador ganha exposição para sua marca e aí reside o maior problema; não conseguimos transformar os nossos eventos desportivos em produtos suficientemente apelativos e não temos uma organização de eventos que prime pelo conforto e segurança dos adeptos e que valorize o papel da comunicação social, em particular da televisão. Com melhor espectáculo, melhores arbitragens, melhores recintos e maior segurança o produto melhora e a cobertura mediática melhora em seguida. Um bom produto nos jornais, rádios e, sobretudo, televisão torna-se rapidamente num íman para os anunciantes. Todos estes passos podem ser dados com melhor gestão, visão e capacidade de realização.
Na era da Internet é inexplicável a pouca visibilidade virtual dos clubes e das federações. O BIC Basket, por exemplo, não tem um website e o website da FAB não é actualizado desde 2012.
FUTEBOL
É inadmissível que a FAF retire a selecção nacional de uma competição regional por falta de fundos “por causa da crise económica”. Se quisermos fazer uma comparação, seria o mesmo que a Federação Portuguesa de Futebol desistisse de uma competição por causa da crise económica em Portugal. Uma federação não pode estar tão dependente do dinheiro público, é preciso criar formas alternativas para obtenção/geração de mais fundos assim como gerir melhor os recursos disponíveis. Uma selecção mundialista que não tem uma loja e cujos produtos oficiais não são visíveis em lado nenhum? Uma entidade com patrocinadores que não realiza eventos para os mesmos? Em 2015 temos que fazer mais.
O ideal para o Girabola seria provavelmente as partes interessadas juntarem-se em torno de um objectivo comum e criar uma liga moderna como fizeram os clubes ingleses no início da década de 1990 quando criaram a Premier League, mas se olhassem para sul e tentassem aprender com a experiência sul-africana já seria óptimo. Hoje existem empresas em Angola com alguma dimensão que estariam disponíveis para aumentar a sua exposição ao desporto se este fosse um produto melhor, uma liga moderna hoje tem que ter uma bola oficial, um naming sponsor, uma água oficial, um banco oficial, uma cerveja oficial e o nosso Girabola não tem nada disto.
É preciso entender o fenómeno de crescente desinteresse dos jovens pelos nossos clubes. O clubismo tem muito de bairrismo e algo vai mal quando um puto do Mártires de Kifangondo diz que o seu clube é o Real Madrid e que não tem clube em Angola. Uma terra com tantos jovens deveria ser um paraíso para os clubes se estes soubessem aproveitar o potencial do que têm a mão. Por mais paixão que os dirigentes tenham pelo desporto é preciso juntar uma dose de racionalidade e ver o desporto como um negócio. Não é concebível contratarmos o melhor futebolista do mundo se não temos uma loja e para quê pagar salários tão altos para um espectáculo tão baixo?
BASQUETEBOL
Angola nunca teve um jogador a participar em jogos oficiais da NBA ao contrário de muitos países africanos mas poucos são os países africanos que se podem gabar de ter tantos jogadores que saíram das suas ligas domésticas para testar na NBA, rapidamente lembro-me de Gerson Monteiro, Olímpio Cipriano, Vítor Muzadi e Carlos Morais. Apesar das limitações, existe qualidade no nosso basquetebol que está patente no domínio exercido sobre o continente mas o potencial não está a ser totalmente aproveitado, a nível desportivo e comercial. Contudo, comparando ao futebol, o basquetebol está uns passos a frente como, por exemplo, o campeonato sénior masculino já vai no segundo naming sponsor (o Banco BIC depois do BAI) mas pode-se fazer mais.
Uma das falhas do BIC Basket é a sua pouca expressão fora de Luanda. No campeonato actual participam apenas Luanda (8 equipas), Kwanza Sul (1 equipa) e Benguela (1 equipa) sendo que o campeão nacional – Recreativo do Libolo – tem sede no Kwanza Sul mas disputa os jogos em “casa” no Kikuxi. É preciso alargar a geografia do campeonato aproveitando as infraestruturas existentes em Cabinda, Huíla, Malange, Namibe, Benguela, Huambo e no Kwanza Sul (porque não o Libolo fazer jogos no pavilhão recentemente renovado no Sumbe? Não é Calulo mas pelo menos é na mesma província). É necessário arranjar uma estratégia que envolva empresários locais para que o basquetebol cresça fora de Luanda, no imediato seria importante recuperar as províncias de Cabinda e da Huíla para o BIC Basket sem perder de olho as outras localidades para o médio prazo.
É igualmente necessário melhorar a organização dos jogos e tornar este desporto com muitas paragens num produto de entretenimento (o show do Toy Limpa Chão não chega). A realidade económica de Espanha é diferente da nossa mas se olharmos para a evolução da Liga ACB em termos desportivos e de entretenimento vemos que é possível fazer mais pelo produto.
Assim como no futebol é necessário associar mais marcas e produtos oficiais ao campeonato nacional (bola, bebidas, carro, banco, etc.) e estes patrocinadores têm que ver o retorno desta relação.
Os clubes também têm que fazer mais. Eu vou muitas vezes assistir jogos de basquetebol e quase não vejo produtos oficiais a serem vendidos. As poucas lojas que existem estão no centro da cidade e nas novas zonas de desenvolvimento urbano os adeptos são alimentados exclusivamente por produtos falsos e os clubes não vendem para outras lojas – nunca vi nada no Belas Shopping ou supermercados – uma situação caricata é ver tantas camisolas do Carlos Morais dos Toronto Raptors e não ver nenhuma do Petro, do Libolo ou da selecção nacional. Outro exemplo é a secção no Kero com produtos oficiais do Sport Lisboa e Benfica, com direito a cachecol com os dizeres “ser benfiquista cuia” mas não se vê lá nada dos clubes nacionais.
O merchandising pode ser aproveitado para os atletas de hoje e para os de ontem. Com efeito, se existir a venda uma camisola da selecção angolana de basquetebol com #15 e com o nome “Conceição” eu compraria sem pestanejar.
Para não alongar mais este post gigante, deixo para outra oportunidade a listagem das várias formas de fontes de receitas para clubes e federações.
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