Diversificação sem divisas tem tanto de sonho como de ilusão

O semanário Expansão reportou recentemente que as empresas industriais em Angola estão a ser particularmente afectadas pela falta divisas. As fábricas angolanas, regra geral, dependem de equipamentos, peças e matérias-primas e subsidiárias importadas. Com a escassez de divisas e a não aceitação de moeda nacional para transacções com o exterior as empresas enfrentam a possibilidade de reduzir a sua produção, uma situação que expõe de forma flagrante o problema estrutural da economia angolana.

A nossa indústria, como o resto da economia, depende grandemente de fornecedores externos e pouco se tem feito para alterar este quadro. Angola pretende industrializar-se sem resolver o problema de sub-produção do sector primário, o que me parece ser extremamente desafiante, sobretudo, num país fechado (apesar do peso do comércio externo no PIB indicar o contrário).

A falta de divisas não só ameaça a produção actual como põe em cheque a produção futura, a tal que permitirá a diversificação. Os novos projectos industriais precisam de equipamentos externos, serviços de entidades externas e matérias-primas do exterior para serem realizados. Sem divisas não há maquinas, não há assistência técnica e não há matérias-primas e, naturalmente, não há produção.

A nossa indústria de bebidas que se tem manifestado como das mais afectadas pela escassez de divisas, tem sido muito protegida por medidas do governo. Contudo, os produtores de bebidas (excepção da água de mesa) continuam dependentes de matérias-primas importadas e o aumento da sua capacidade significa um aumento das necessidades de divisas. Não seria má ideia o governo exigir mais de quem apoia. No caso particular dos produtores de sumos e cervejas o estado poderia exigir – estabelecendo um calendário e metas quantitativas – que estas empresas apoiassem a produção local de parte das suas matérias-primas como acontece na Zâmbia onde a Zambian Breweries (Grupo SAB Miller) apoia a produção local de cevada e a utilização de sorgo em algumas cervejas. Desta forma, a indústria fomenta a agricultura local e são reduzidas as necessidades de divisas.

Sobre a produção agrícola – base para a agro-indústria – existem outras questões a abordar. Apesar dos sinais positivos que temos assistido na agricultura empresarial, continua a ser necessário encontrar novas soluções para a agricultura familiar (ou campesina). O Brasil tem muita experiência nesta área e poderia ser útil aproveitar as boas relações para relançar o sector em Angola. Os camponeses têm que estar agrupados para capacitação, financiamento, aprovisionamento, produção e venda do produto. No caso concreto da iniciativa pública Programa Aquisição de Produtos Agrícolas (PAPAGRO), fica claro que além da necessidade de refinamento do próprio programa, as etapas anteriores (formação, financiamento e produção) precisam de ser melhor abordadas.

A indústria de plásticos em Angola conta já com um número significativo de produtores mas o polímeros que usam para produção de diferentes produtos são importados. Se fôssemos capazes de estabelecer uma indústria petroquímica, os polímeros poderiam ser produzidos localmente, mas os atrasos no arranque da refinaria não ajudam. Mesmo sem a indústria petroquímica, o governo poderia incentivar a reciclagem de plásticos e outras embalagens (latas, alumínio) para produção local de matérias-primas e subsidiárias.

Estas são algumas medidas que poderiam reduzir a exposição do sector industrial angolano ao exterior reforçando a disponibilidade de matérias-primas e subsidiárias locais. Contudo, para produzirmos mais e de forma mais competitiva serão necessárias algumas medidas adicionais como a redução da carga fiscal sobre os produtores como avançou José Severino e mais e melhor investimento em infra-estruturas cuja deficiência encarece a produção industrial.

Com as nossas limitações a nível da capacidade técnica, sem produção local de equipamentos e com reduzida produção local de matérias-primas é irrealista pensar em produção nacional sem recurso ao exterior e como o kwanza não “fala estrangeiro” têm que ser chamadas a divisas, se estas continuarem a escassear é melhor estarmos preparados para quebra da produção nacional e para o adiamento da diversificação.

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2 thoughts on “Diversificação sem divisas tem tanto de sonho como de ilusão

  1. Angola precisa de atrair investidores para indústrias de produção de tecnologias, fábricas que produzam peças para máquinas, pneus, acessórios electrónicos, linhas de produção de materiais técnicos, ferramentas, etc. … A mão de obra em Angola é barata, e isso podia ser uma vantagem para grandes companhias montarem fábricas que pudessem posteriormente exportar os seus produtos para mercados africanos e europeus. Um mundo de oportunidades que não é devidamente estudado para vir a ser aproveitado.

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  2. Pingback: ANGONOMICS

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