Palancas Negras, do lixo ao luxo em meia dúzia de dias

Cruzei hoje com uma publicação no perfil do Instagram do Xé Agora Aguenta que cita um economista que terá estimado que o PIB angolano poderá experimentar um crescimento extraordinário entre 0,3% e 0,5% em 2024 “com o desempenho positivo da selecção de futebol angolana” porque “a felicidade geral gerará uma sensação de bem-estar que irá proporcionar um maior consumo privado das famílias, das empresas financeiras e não financeiras, e do próprio Estado”. Sem prejuízo das minhas reservas sobre tão auspiciosa estimativa cujos detalhes desconheço, a mim agrada particularmente testemunhar esta onda de apoio aos Palancas Negras pelo desempenho que surpreendeu grande parte dos angolanos cuja relação com a selecção tem sido marcada pela indiferença e pelo escárnio, nos últimos anos.

Para muitos, o ponto de inflexão terá sido o famoso 4-4 contra o Mali registado no primeiro jogo da primeira fase do CAN de 2010 no estádio 11 de Novembro em Luanda. Na verdade é que por mais traumático que tenha sido, o dito jogo não ditou o fim da campanha e sequer impediu que Angola se classificasse em primeiro lugar no grupo, a nossa participação terminou na fase seguinte em jogo contra o Gana que acabou por ser o finalista vencido, precisamente a mesma selecção do Gana que no mesmo ano fez história no mundial da África do Sul. Ainda assim, o tal 4-4 é apresentado por muitos angolanos como razão suficiente para ditar um divórcio com a selecção nacional, a mesma selecção que apenas 4 anos antes (2006) se tinha juntado ao exclusivo grupo de selecções africanas com participação em mundial. Contudo, é verdade que depois do CAN angolano foram realizados mais 6 torneios e Angola falhou 3 destes torneios e nos outros 3 em que participou não passou de fase, incluindo em 2012 quando Manucho foi um dos melhores marcadores.

O alegado trauma dos angolanos com o futebol nacional combinado com a gestão pouco inspirada da federação e com o período prolongado de decréscimo económico, contribuíram para uma redução dos apoios ao futebol nacional (e ao desporto como um todo) e tornou ainda mais difícil obter sucesso e inclusive para FAF reunir as condições necessárias para atrair os atletas de origem angolana que actuam lá fora que representam um potencial reforço para nossa selecção. Os traumatizados do futebol angolano ignoraram inclusive as participações positivas recentes do Primeiro de Agosto e do Petro de Luanda nas principais competições de clubes da CAF e nas redes sociais o futebol angolano não passava de uma fonte para produção de memes, os mesmos que se foram reproduzindo dias antes da estreia de Angola neste CAN da Côte D’Ivoire e felizmente o tom mudou totalmente nos últimos dias.

How it started, how it’s going

Após o empate contra Argélia na estreia a selecção deu seguimento com duas vitórias que elevaram a selecção para o topo do grupo e para o topo das fontes de alegria dos angolanos. O entusiamo continuou em crescendo e teve o ápice com a vitória contra os nossos vizinhos namibianos que revelou para muitos a qualidade do treinador com a ousada substituição de um médio-centro após a expulsão do guarda-redes para manter intacto o trio de ataque. Aquele jogo revelou também o apoio material que a FAF dias antes andou a reclamar e de forma espontânea diferentes instituições e entidades se perfilaram a oferecer apoio pecuniário aos jogadores como forma de incentivo para que a delegação tenha mais uma razão para manter a chama viva.

Por um lado, é bom ver os nossos jogadores com a visibilidade que uma selecção que representa Angola merece e a serem premiados pelo seu bom desempenho. Contudo, não deixa de ser notado um perfume de oportunismo para muito deste apoio que efectivamente tem o potencial para produzir os efeitos esperados dos incentivos e ser o empurrão necessário para selecção alcançar níveis nunca atingidos numa fase final do CAN de seniores. A desorganização da FAF é histórica e com potencial para alimentar o conteúdo de vários livros, desde o incumprimento contratual com treinadores e atletas à incapacidade de colocar no mercado material de merchandising para quem pretende estar devidamente equipado para apoiar a selecção, mas não deixa de ser intrigante que a nossa federação que nos últimos anos aparece constantemente nas notícias a reclamar por apoios para todas as suas tarefas (desde o suporte para as selecções de formação aos meios necessários para as campanhas das competições da CAF e da FIFA) vê hoje um grupo de entidades não patrocinadoras a surfar a onda do sucesso da selecção que a FAF montou com uma série de dificuldades precisamente – diz a FAF – porque poucos se disponibilizaram para associar a sua marca à selecção nacional a troca de exposição para sua marca.

O desporto para ter sucesso precisa que a organização e o meios financeiros andem de mãos dadas e para que isto aconteça é necessário que haja cooperação e confiança mútua num processo que busca um resultado satisfatório para parte desportiva e para os patrocinadores, o que não é comum é termos “patrocínio ex-post” ou prémios de desempenho desconhecidos no ponto de partida como estamos a assistir agora. Ainda que seja plausível que estas manifestações estejam a ser alimentadas por sentimentos positivos, ninguém ficará perplexo se for apontado algum oportunismo como motivação relevante para esta repentina descoberta de amor pelos Palancas Negras que deixaram de ser um meme ambulante para propulsores do crescimento do PIB.

Instagram

O desporto angolano padece de dois males principais: (i) a baixa qualidade da gestão desportiva (com raras excepções) e – de certa forma conectada com a primeira – e (ii) a sistemática falta de patrocínios. Estas makas existem desde o atletismo a canoagem e o talento desportivo dificilmente se desenvolve sem o suporte consistente e comprometido das estruturas que governam desporto, sejam elas públicas ou privadas. Assim, a FAF vai continuar a ter muitos desafios pela frente e seria importante que os apoios de agora sejam convertidos em compromissos de longo prazo com contratos entre as partes com objectivos claros e com avaliação periódica dos resultados. A selecção principal vai ter nos próximos tempos muitos desafios, que inclui a classificação para o CAN 2025 (sim, próximo ano) e para o mundial de 2026 que começou já com dois empates fora contra Cabo Verde e Ilhas Maurícias com alguns problemas organizacionais pelo meio que a FAF diz ser alheia. O meu desejo mais do que o melhor resultado possível para o CAN em curso é mesmo que permaneça o interesse e apoio incondicional (mas não cego) aos nossos representantes porque apenas desta forma é possível obtermos mais resultados satisfatórios do que negativos, porque da mesma forma que é certo que o trabalho organizado e devidamente suportado gera bons resultados, existem sempre momentos menos bons e apesar do divórcio ser um desfecho possível de qualquer relação, o que se quer é que o casamento seja na alegria e na tristeza, no sucesso e no fracasso.

O feito de Bruno Fernando é para celebrar

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Bruno Fernando (Fonte: One37pm)

No passado dia 20 de Junho como é do conhecimento de todos o basquetebolista angolano Bruno Fernando foi escolhido no Draft da NBA pelos Atlanta Hawks (via Philadelphia 76ers) e naturalmente houve grandes festejos de angolanos mundo afora porque finalmente o melhor basquetebol de África passa a ter um representante na NBA. Mas não tinha ainda terminado a ressaca nacional dos festejos e apareceu um pequeno exército de “especialistas” para nos aconselhar a frear nos festejos porque “o Bruno Fernando ainda não entrou na NBA” e que “não é o primeiro a chegar nesta fase”.

De facto, nenhum jogador dos 60 que foram seleccionados no dia 20 tem contrato com uma equipa da NBA porque as formalizações só acontecem em Julho, contudo, para os atletas escolhidos na primeira ronda (os 30 primeiros) estão aptos para um contrato garantido de pelo menos dois anos sendo que os jogadores da segunda ronda, ainda que quase garantidos, deverão aguardar pelo encerramento dos plantéis e este é o principal motivo para sermos aconselhados a conter os festejos apesar da comunidade de Maryland onde Bruno se fez lenda como jogador da equipa da universidade local não se conteve (e bem) e organizou uma festa e celebrou efusivamente a entrada do angolano na NBA que anunciou Bruno Fernando como “the first Angolan player ever to be drafted into the NBA!” e este facto separa o Bruno Fernando os outros atletas angolanos que com grande mérito tiveram a oportunidade de treinar em equipas da NBA em processos de selecção de pré-época como Gerson Monteiro (San Antonio Spurs), Olímpio Cipriano (Detroit Pistons), Víctor Muzadi (Dallas Mavericks) e Carlos Morais (Toronto Raptors). Bruno foi o primeiro a ser escolhido mas não foi o primeiro angolano a submeter o seu nome para selecção no Draft, antes dele tivemos o Valdelício Joaquim e o Yanick Moreira e é certo que no curto prazo teremos mais.

Embora não seja ainda oficial e ainda que não venha a ser, o feito de Bruno Fernando é assinalável para um rapaz que iniciou no mini basquete do Primeiro D’Agosto e foi uma peça fundamental das selecções nacionais que ganharam os Afrobaskets sub-16 e sub-18 e que soube maximizar a oportunidade de ingressar no basquetebol dos Estados Unidos ainda nas categorias de formação e cresceu mais ainda, tanto que uma das ligas profissionais mais exclusivas do mundo o seleccionou na posição 34 numa lista que incluía 233 jogadores. Bruno acabou por estar abaixo da expectativa inicial de integrar os 30 primeiros seleccionados mas toda a sua história conta que o trabalho compensa e exemplos de second round picks ou mesmo jogadores não seleccionados (undrafted) que marcaram o seu nome na NBA abundam, para não irmos longe na memória basta olhar para as mais recentes finais da NBA onde Draymond Green (escolha #35) é peça fundamental nos Warriors e o undrafted Fred VanVleet foi um dos principais contribuintes da vitória dos Raptors.

O outro lado da moeda é uma possibilidade, ou seja, por decisão técnica os Hawks podem dispensar o Bruno Fernando ou assinar um contrato a duas-vias (two way-contract) que colocam o atleta a rodar na equipa afiliada da G-League mantendo-o disponível para juntar-se aos Hawks sempre que necessário mas a possibilidade de integrar os plantel final de 15 jogadores é muito forte, embora não se conheça ainda que equipa terá no início de Julho quando as trocas começarem a ser finalizadas existem alguns sinais positivos do interesse dos Atlanta Hawks que fizeram uma troca para cima (trade up) para poder garantir o Bruno Fernando, ou seja cederam a escolha 57 do Draft de 2019 e uma escolha de Draft de 2020 para poderem escolher Bruno Fernando na posição 34.

A Summer League que é reservada aos jogadores com menos experiência e rookies será muito importante para o Bruno mostrar o seu valor e iniciar o processo de confirmação do seu lugar no plantel do Hawks que estão num processo de construção focado no futuro com Trae Young e John Collins como peças principais até ao momento a quem se juntam dois notáveis rookies em De’Andre Hunter e Cam Reddish. Integra ainda equipa o antigo colega de Bruno Fernando em Maryland Kevin Huerter. A Summer League em Las Vegas começa no dia 5 de Julho mas como a troca que levará o Bruno de Philadelphia para Atlanta só será completada a 6 de Julho o angolano não deverá estar envolvido na estreia dos Hawks mas certamente terá tempo para mostrar o seu valor e continuar a escrever a sua história, deste lado estaremos sempre para apoiar. O feito é para celebrar e já.

Gestão desportiva em Angola tarda em mudar

A desistência da equipa de basquetebol do Recreativo do Libolo (renomeada Sport Libolo e Benfica recentemente) era previsível para quem acompanhou o último campeonato nacional. O plantel do Libolo era dos mais caros do desporto nacional e os problemas financeiros começaram a ser visíveis para o público em geral a meio do campeonato quando começaram a ser reportados problemas relacionados com pagamentos de salários.

O desporto profissional nos países em estágio de desenvolvimento mais avançado do que o nosso é um grande gerador de receitas mas para competir ao mas alto nível os clubes são igualmente obrigados a ter gastos consideráveis com os atletas que são o maior custo operacional de qualquer clube profissional. Assim, apesar de ser uma actividade geradora de avultados proveitos, por norma, não gera lucros avultados e muitas vezes opera consistentemente com resultados líquidos negativos, mantendo a actividade viva com suporte de produtos financeiros alinhados com o modelo de exploração da alta competição naqueles países.

Em Angola, como foi já escrevi aqui o desporto tem sido ao longo dos anos sustentado pelo sector público – directa ou indirectamente – inclusive no caso de “clubes privados” quando os seus patrocinadores principais têm a sua actividade empresarial suportada por relação privilegiada com o sector público.

A redução da capacidade do Estado realizar despesas nos últimos anos atingiu o coração do desporto nacional e as dificuldades dos clubes pioraram mas, infelizmente, a gestão mesmo em modo reactivo não parece ser capaz de responder à altura dos desafios. Os clubes nacionais mesmo nas modalidades que gozam de maior popularidade como futebol e basquetebol continuam sem uma estrutura de geração de receitas consistente e sustentável.

Os principais clubes, Petro de Luanda e Primeiro D’Agosto, estão numa posição privilegiada para aumentar de forma significativa as suas receitas pela história de sucesso desportivo construída ao longo dos anos que os colocou no topo das preferências dos angolanos para num quadro de melhor organização e algum investimento. Os clubes menores dependerão sempre de um crescimento qualitativo e organizativo das competições em que se entregam, por isso, no caso do desporto nacional “a salvação não é individual” mesmo para aqueles com melhores condições de monetização da sua marca.

A falta de receitas com ingressos, a dimensão dos direitos televisivos e a insignificância actual do merchandising atestam não só o estado calamitoso das finanças dos clubes como representam igualmente a sua melhor oportunidade, para tal, será necessário a conjugação de planos individuais integráveis num plano macro único para cada competição (como Girabola Zap, Unitel Basket ou competições sénior em andebol).

Para avançarmos é necessário o reconhecimento imediato da insustentabilidade do modelo suportado no financiamento público e usar de forma inteligente os fundos para consultoria capaz e consequente para alteração transformadora do modelo de exploração comercial do nosso desporto profissional que não poderá ser isolado de um programa de desenvolvimento de camadas não profissionais.

Este é um tema recorrente neste espaço que infelizmente não desaparece porque a estrutura subjacente pouco se alterou apesar das dificuldades que apresenta. Os clubes continuam sem conseguir melhorar a qualidade da competição o suficiente para atrair mais investidores nacionais e é necessário reconhecer que os fundos disponíveis limitam as manobras possíveis assim como o estado depressivo da nossa economia afectou as disponibilidades dos potenciais patrocinadores, mas por norma, nos países mais avançados economicamente o desporto profissional é quase imune ao contexto económico adverso. Não é expectável que passamos a ter um desporto profissional a operar em contra-ciclo nos períodos de crescimento económico reduzido ou negativo no médio prazo mas pela natureza passional do desporto num quadro de melhor gestão seria de esperar maior resiliência.

 

 

O CAN tem mesmo que ser em Janeiro?

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A principal competição de selecções do futebol africano, CAN, começa no próximo dia 14 de Janeiro no Gabão e para muitos jogadores isto é um problema. É um problema porque as principais estrelas do futebol africano jogam profissionalmente em campeonatos europeus onde os meses de Janeiro e Fevereiro são muito importantes para a definição das posições em que acabam as equipas no final de Maio.

O Liverpool perdeu para a selecção do Senegal Sadio Mané que é das suas principais forças ofensivas esta temporada (9 golos em 21 jogos) que vai falhar pelo menos 7 jogos (2 da taça da liga, 1 da taça da Inglaterra e 4 da liga inglesa) se o Senegal jogar a final no dia 5 de Fevereiro em Libreville. A vontade de defender as cores da selecção, que tem protecção das regras da FIFA, muitas vezes choca com os interesses dos clubes e dos atletas que podem ver a sua carreira prejudicada por uma ausência forçada para participar no CAN, como aconteceu com o Djalma Campos que após ter ido ao CAN representar Angola perdeu o lugar no onze do Porto e nunca mais o recuperou e foi transferido para Turquia onde representou clubes sem grande expressão.

O também jogador do Liverpool Jöel Matip está neste momento no centro de um diferendo entre a selecção dos Camarões e o seu clube porque aparentemente não quer representar a selecção no CAN do Gabão e o clube alega que o jogador de 25 anos já abandonou o futebol internacional, o que torna sem efeito as obrigações impostas pela FIFA. Isto não seria um problema se o calendário do futebol internacional fosse minimamente harmonizado como acontece com o basquetebol, que apesar de ter uma expressão internacional manifestamente menor é a segunda modalidade mais popular no mundo.

Transformar o sistema FIFA no sistema FIBA é de todo impossível, uma vez que as confederações continentais de futebol actuam num quadro muito mais independente do que as suas congéneres do basquetebol, mas não parece irrealizável harmonizar o calendário dos campeonatos nacionais de forma a evitar choques entre a progressão normal das ligas e as competições de selecções. Por exemplo, no basquetebol sénior internacional, as ligas nacionais estão alinhadas com o calendário da FIBA que permite a realização de competições de selecções sem interferência com as ligas nacionais, seja esta o BIC Basket ou a NBA enquanto que no futebol um jogador africano ou asiático pode pôr em risco a sua carreira num clube europeu por representar a sua selecção num campeonato continental que decorre em Janeiro.

A solução mais simples passaria por harmonizar os campeonatos nacionais de clubes em África e nas Américas com as ligas da Europa, fazendo assim coincidir as pré-épocas e o grosso dos campeonatos nacionais, deixando parte dos dias reservados às férias dos atletas para a organização periódica de competições de selecções a nível continental e mundial. Passando o CAN para a segunda quinzena de Junho em cada dois anos (eu preferia que fossem quatro) a CAF evitaria a tensão entre clubes europeus e atletas africanos que se repete nesta altura e, em muitos casos, com consequências negativas para a carreira dos atletas. Ademais, e provavelmente o maior ganho de tal mudança, realizar o CAN entre Junho e Julho tem o potencial de aumentar a exposição da competição, uma vez que com menos competições em curso (nomeadamente ligas europeias) mais tempo de antena teria o futebol africano com reflexos a nível comercial.

Girabola Zap. Porcelana pode ser o primeiro de muitos a afundar

Há algum tempo escrevi aqui sobre a dependência financeira do desporto angolano em relação ao sector público. Este facto colocava o nosso desporto na linha da frente das potenciais vítimas da crise económica.

O Girabola entretanto conseguiu um patrocinador privado que segundo o Jornal dos Desportos (JD) paga USD 5 milhões por ano à Federação Angolana de Futebol (FAF). O contrato com a Zap deu um sobrenome ao Gira que passou a chamar-se Girabola Zap e é válido por cinco anos. A empresa distribuidora de televisão por subscrição e Internet ficou com o direito de transmissão dos jogos do campeonato num canal fechado e prometeu (e cumpriu) melhorar a qualidade das transmissões.

Segundo o JD a FAF irá abocanhar USD 1 milhão para si e distribuirá USD 4 milhões pelos clubes, sendo que USD 1,5 milhões estão reservados para o campeão e os restantes USD 2,5 milhões servem para pagar os direitos de transmissão televisiva a cada um dos dezasseis clubes que disputam a prova.

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Na notícia do JD o autor especulou que os USD 5 milhões representariam a tábua de salvação dos clubes mas não poderia estar mais enganado. No dia 29 de Maio na voz da sua presidente da messa da Assembleia Geral, Joana Lina, o Porcelana Futebol Clube do Kwanza Norte anunciou o abandono do campeonato por não ter condições financeiras para continuar a prova. Admitindo uma distribuição equitativa dos USD 2,5 milhões (que poderá não é o caso) o Porcelana receberia da FAF (via Zap) cerca de 156 mil dólares este ano que seriam provavelmente a maior receita do clube. Segundo Joana Lina, o clube acumula dívidas com colaboradores (três meses sem pagar salários aos jogadores) e com fornecedores, entre eles a própria FAF.

A direcção do Porcelana falou em dívidas mas nãos dimensionou, aliás o nosso desporto não goza de boas relações com a transparência e os orçamentos dos clubes são, regra geral, “segredo de estado”. Aferir a gravidade da situação financeira dos nossos clubes e as suas necessidades é um exercício especulativo. A FAF supostamente exigiu aos clubes a apresentação das suas responsabilidades contratuais mas não é do conhecimento público que esta informação tenha sido disponibilizada.

O que se sabe é que o Girabola Zap é competição nacional melhor distribuída geograficamente com a participação de 8 das 18 províncias e num país com custos de transporte proibitivos a “aventura” de participar no Gira pode sair cara.

Regra geral os custos com salários dominam os orçamentos dos clubes, mas neste deserto de informação que é o nosso desporto é difícil aferir. Contudo, segundo uma reportagem de 2013 (no bom tempo) do jornal Agora o Kabuscorp gastava cerca de 133 mil dólares em prémios por cada vitória, sendo que à cada jogador cabiam 5 mil dólares e ao treinador 7,5 mil dólares. Segundo a mesma reportagem o Recreativo do Libolo gastava 128 mil dólares e o Petro de Luanda cerca de 120 mil dólares em prémios por cada vitória, no Primeiro D’Agosto os prémios variavam entre 75 e 100 mil dólares.

Os prémios hoje provavelmente já não são tão expressivos mas é possível perceber que os valores investidos no nosso campeonato não geram retorno, nem em termos da qualidade dos jogos nem em termos financeiros. Os valores vindos do contrato com a Zap são uma gota no oceano de despesas dos clubes e estes precisam de fazer mais para gerar receitas e num momento em que os potenciais patrocinadores vivem também dificuldades o desafio é ainda maior.

O modelo de patrocínio colectivo, como é o caso da Zap, pode ser o melhor caminho neste período de arrefecimento económico. Os clubes e a FAF (que organiza a prova) deveriam apostar em alargar o leque de patrocinadores do campeonato aumentando assim o bolo a distribuir entre todos, sem prejuízo dos clubes aumentarem os esforços na busca de modelos de financiamento para a sua operação, quer sejam sócios ou patrocinadores.

O que reserva o futuro próximo para o basquetebol angolano

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Selecção de Angola no Campeonato Mundial sub-17 da FIBA – Dubai 2014 (Fonte: Fiba)

O presidente da Federação Angolana de Basquetebol (FAB), Paulo Madeira, disse recentemente ao Jornal dos Desportos que está preocupado com o futuro do basquetebol nacional, sobretudo, porque tem encontrado dificuldades em financiar as actividades das equipas de base e pelo emagrecimento do campeonato nacional sénior feminino, que passa a ter apenas três equipas piorando ainda mais a sua minúscula dimensão.

O consulado de Paulo Madeira a frente da FAB fica marcado por momentos de esperança como a vitória no Afrobasket sub-16 e presença no mundial sub-17 da equipa orientada por Manuel Silva e momentos alarmantes como a perda dos títulos africanos em sénior masculino e feminino que deixa a equipa feminina afastada dos Jogos Olímpicos 2016 e obriga a equipa masculina à lutar por uma vaga dificílima num torneio pré-olímpico.

Para 2016 e  para o futuro próximo, como na generalidade da vida social em Angola, o basquetebol enfrentará sérias dificuldades financeiras que poderão afectar os clubes e, consequentemente, o desempenho das selecções nacionais.

O início da presente época do BIC Basket tem sido marcado pela ausência de alguns jogadores estrangeiros por razões desconhecidas e antes mesmo de começar a competição o Sporting do Bié anunciou a desistência do campeonato por incapacidade financeira. No campeonato sénior feminino a quarta equipa abandonou a competição por dificuldades financeiras e o campeonato nacional passou a ter apenas três equipas. Recentemente nos campeonatos nacionais sub-16, oito equipas desistiram por problemas financeiros (4  em feminino e 4 em masculino) e a nível das selecções jovens faltam fundos para cumprir os objectivos traçados pela FAB segundo Paulo Madeira.

temos uma preocupação, principalmente a nível das selecções de formação, que são as que têm mais dificuldades em trabalhar. Temos de continuar à procura de apoios e de patrocinadores para que possamos gerir os centros especiais de treinos.

Paulo Madeira

Pese o papel de representação global da modalidade da FAB, os principais agentes do basquetebol são os clubes, quer seja na formação como no basquetebol profissional e os clubes vão estar curtos de fundos para levar a cabo os seus programas de formação e esta é a maior ameaça ao futuro do basquetebol em Angola.

O nosso desporto no geral é muito dependente de fundos públicos e esta dependência fez com que o potencial de realização de receitas próprias fosse negligenciado durante anos. Os nossos clubes e federações precisam de organizar melhor as competições e transformar o desporto num produto de entretenimento e num palco para o desfile de marcas, criando uma plataforma com benefícios mútuos. Com as empresas e famílias mais pobres atrair patrocinadores e pagantes é cada vez mais desafiante, mas não há alternativas a este caminho. O modelo de dependência pública não é sustentável e os nossos objectivos e aspirações exigem formação de qualidade e uma liga competitiva, tudo isto precisa de dinheiro.

No passado, com um grupo reduzido de atletas e de equipas profissionais a selecção angolana de basquetebol masculina contruiu um palmarés impressionante a nível continental mas os anos de domínio inquestionável da nossa selecção parecem estar no fim. Não é expectável que Angola desapareça dos lugares cimeiros nos próximos anos mas ganhar títulos vai ser cada vez mais difícil uma vez que vão emergindo cada vez mais selecções capazes de nos causar problemas, quer sejam suportadas por boas competições internas (como a Tunísia e o Egipto) ou com recurso à atletas da diáspora (como Nigéria, Senegal e Camarões).

O basquetebol feminino enfrenta um futuro cheio de incertezas, com o emagrecimento da principal liga e com o número reduzido de atletas em formação a selecção poderá ver-se afastada dos lugares de topo a nível de África e, consequentemente longe das competições internacionais.

Para o basquetebol masculino, apesar das questões a volta do modelo de financiamento e da organização dos clubes e da federação, tenho melhores expectativas para o futuro próximo. O talento desportivo existe, como demonstra o recente sucesso das selecções de base e o potencial de alguns atletas jovens que já actuam como profissionais e outros que militam ainda na formação, mas o talento é um bicho que come muito, se passar fome jamais atingirá o seu potencial.

Angola tem um grupo de atletas nascidos entre 1990 e 1998 (Grupo 90-98) que nos permitem antever a construção de uma selecção forte. Este grupo poderá contar ainda com alguns jogadores mais experientes nos próximos anos, nomeadamente Carlos Morais, Leonel Paulo e Felizardo Ambrósio. O Grupo 90-98 inclui atletas como Yanick Moreira, Valdelício Joaquim, Bráulio Morais, Gildo Santos, Edson Ndoniema, Jone Pedro, Islando Manuel, Pedro Bastos, Joaquim Pedro, Gerson “Lukeny” Gonçalves, Teotónio Dó e Malik Cissé. Numa segunda linha aparecem jovens como Avelino Dó, Valdir Victoriano, João Jungo, Rifen Miguel, Eric Amândio, Bruno Fernando e Sílvio Sousa.

Sílvio Sousa e Bruno Fernando são hoje as maiores esperanças para que dentro de anos (2/3) seja quebrado o enguiço da presença angolana na NBA. Os antigos atletas do Primeiro d’Agosto são actualmente destaque na Montverde Academy na Florida, a academia tem um dos melhores programas de basquetebol do ensino secundário dos Estados Unidos e de lá saíram recentemente D’Angelo Russell (LA Lakers) e Ben Simmons ainda no campeonato universitário da NCAA (LSU). Bruno Fernando termina o secundário este ano e é considerado o 68.º melhor jogador da classe de 2016 dos Estados Unidos pela ESPN que considera Sílvio Sousa o 2.º melhor jogador da classe de 2018. Também na Florida (West Oak Academy) estão Eric Amândio e Rifen Miguel, ambos jogadores das selecções de base sendo que o primeiro é um base promissor da formação do Petro de Luanda e o segundo vem do Benfica de Lisboa.

Mas como o basquetebol não se resume ao talento disponível para formar uma selecção sénior masculina forte, é preciso ter atenção com todas as maleitas que limitam o aproveitamento do talento que temos a disposição. Penso que já é tempo do nosso basquete cultivar uma relação mais próxima com os Estadso Unidos em detrimento das relações com a escola europeia, sobretudo a nível da formação de treinadores. Temos que encontrar forma de dar mais horas de prática aos atletas da base e fazer chegar a modalidade com alguma significância à mais províncias. É urgente buscar novas soluções de financiamento (patrocinadores, mechandising, negociação de direitos, etc.) que nos permitam desenhar um futuro menos dependente do financiamento público.

Para já, esperar que se resolvam as makas de organização e que os nossos atletas tenham todo o sucesso do mundo.

Os motores da Formula 1, o carro eléctrico e o futuro do petróleo

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Em 2014 a Formula 1 (F1) deixou de usar os motores 2.4 L V8 naturalmente aspirados e passou a usar propulsão híbrida com unidades de potência (power units) compostas por um motor a gasolina 1.6 L V6 Turbo e por duas unidades eléctricas alimentadas pela energia gerada pelo próprio carro. Esta mudança gerou alguma polémica porque a F1 perdeu o som raivoso dos motores e os carros passaram a ser mais lentos (neste caso não só pelo motor, mas também pelos pneus e limitação regulamentar do fluxo de combustível). Contudo, estas mudanças foram exigidas pelos construtores de motores – nomeadamente a Renault – anos antes, para que a categoria estivesse alinhada com o caminho que a indústria de automóveis estava a seguir: motores híbridos que permitem reduzir o consumo de combustível, sem que isto implique perca de performance. Com esta mudança de paradigma a F1 de 2015 consome menos 35% de gasolina que em 2013.

Eu tive o prazer de ouvir o inquietante roncar dos motores V8 na F1 que é de facto mais impressionante que o som expelido pela propulsão V6 Turbo Híbrida, mas a nova configuração é o futuro e antes de ser usada na F1 já estava nas estradas e os construtores pretendem usar a F1 como laboratório para desenvolver ainda mais a tecnologia que nas estradas já não se resume aos pequeno-citadinos uma vez que os três super desportivos de série mais espectaculares lançados nos últimos tempos são três híbridos que usam uma tecnologia semelhante a da Formula 1: (i) McLaren P1, (ii) Porsche 918 Spyder, e (iii) Ferrari LaFerrari.

Segundo a Llewellyn Consulting citada por um colunista do The Guardian, se o mundo adoptasse a tecnologia da F1 poderia poupar cerca de 2% ou mais em consumo de petróleo bruto por ano, adicionando mais uma questão a sustentabilidade da procura de petróleo no longo prazo, sobretudo porque o sector automóvel, um dos maiores consumidores de combustíveis, não se quer ficar pelos carros híbridos e avança decididamente para adopção do carro eléctrico. A Tesla sediada nos Estados Unidos terá a companhia de outras marcas de luxo na produção de carros eléctricos em breve: a BMW anunciou que vai converter toda sua gama para carros eléctricos e híbridos no futuro próximo enquanto que a Porsche apresentou no salão automóvel de Frankfurt o protótipo Mission E, uma espécie de Porsche Panamera eléctrico que recorreu à tecnologia que a marca alemã usou no protótipo 919 Hybrid LMP1 (construído para disputar o World Endurance Championship (WEC) também conhecido por Le Mans series) e que poderá estar nas estradas no final desta década.

A Federação Internacional do Automobilismo (FIA) que organiza os campeonatos da F1 e WEC onde abundam vários híbridos produzidos por grandes construtores (como Porsche, Audi, Peugeot, Toyota e Nissan) lançou a Formula E, uma espécie de Formula 1 de carros eléctricos que foi recebida na sua época de estreia com algum entusiasmo pela indústria, adeptos e patrocinadores, atraindo vários ex-pilotos da F1.

Apesar do entusiasmo de alguns sobre o futuro do automóvel e como isto poderá impactar a procura do petróleo, no momento as vendas de carros eléctricos e híbridos ainda não conseguiram ganhar tracção; nos Estados Unidos os carros eléctricos vendidos no final de 2014 eram cerca de 200 mil, muito abaixo do um milhão que antecipava Barack Obama – na altura senador – em 2006 sendo que a empresa Navigat prevê que só em 2025 a frota de carros eléctricos nos Estados Unidos atingirá um milhão.

Se aposta da Google (ou Alphabet) no “carro auto-dirigido” gerou mais curiosidade do que interesse generalizado da indústria automóvel, a mudança de estratégia da BMW está a ser recebida com alguma apreensão pois poderá trazer consigo outras grandes marcas para a festa dos eléctricos e híbridos e pressionar a procura de petróleo cujo preço, dentre outros factores, já está a ser afectado pelo aumento da produção global. Sendo assim, não é disparatado esperar que dentro de 15 anos a configuração do motor dos nossos carro exija menos combustível e que a procura global pelo ouro negro deixe de crescer ao ritmo da última década.

 

Petro vs D’Agosto: casa meia cheia e nenhum anúncio visível

No passado sábado, 12 de Setembro, jogaram no estádio 11 de Novembro Petro de Luanda e D’Agosto para a segunda volta do Girabola 2015, pese o facto do Petro estar completamente afastado da discussão do título e do D’Agosto estar com poucas hipóteses de lá chegar dentro da qualidade habitual do nosso campeonato o jogo foi bom. Contudo, o estádio apresentava apenas um anel cheio a meio da segunda parte ficando o anel superior às moscas: o maior clássico do futebol angolano não consegue encher as bancadas do maior estádio do país.

Se ter cerca de 20 mil pessoas num Petro vs. D’Agosto é insatisfatório, ver um estádio despido de anúncios publicitários num jogo destes é preocupante. O desporto angolano tem de libertar-se da dependência do estado imediatamente e buscar a realização do seu potencial, em particular os clubes mais tradicionais como o Petro e o D’Agosto. O mínimo que se pode exigir ao dono da casa, no caso o Petro de Luanda, é cobrir o estádio com as marcas dos seus patrocinadores já que não conseguem vender espaços para potenciais anunciantes. Um estádio despido de publicidade naquele que é o maior clássico do nosso futebol é o cúmulo da incompetência comercial.

Se olharmos para a publicação da Deloitte (Football Money League) que lista os clubes de futebol que geram mais receitas época após época nota-se que os três principais meios de receitas são: (i) comercial (sponsorship/merchandising) (ii) direitos televisivos e (iii) bilheteira por esta ordem, uma vez que a Deloitte exclui as receitas com vendas de jogadores. Olhando para o nosso derby fica claro que as receitas com bilheteiras estão abaixo do desejado e que os clubes precisam de investir no produto para conseguirem melhores contratos de transmissão televisiva e para levarem mais gente aos estádios.

Quando marcou o primeiro golo do jogo o avançado do D’Agosto Ary Papel imitou um gesto de Cristiano Ronaldo que é uma máquina de fazer dinheiro, se calhar o D’Agosto e os seus parceiros deveriam imitar o Real Madrid na promoção das suas principais estrelas e assim melhorar a sua atractividade para potenciais anunciantes. Apesar das insuficiências, o D’Agosto até é dos clubes mais activos em termos de marketing mas ainda assim alguém lembrou-se de usar equipamentos da desconhecida marca “Stadio”. Se o clube pretende aumentar as receitas com a venda de camisolas tem que arranjar um fornecedor de equipamento melhor, investir no design e em mais pontos de venda ou expandir a distribuição por via de parceiros porque a loja do Rio Seco não chega.

Pessoalmente, penso que o preço cobrado para assistir um jogo de futebol em Angola é acessível (varia entre 500 e 1000 kwanzas) mas as clareiras dos estádios indicam que falha alguma coisa. Desconfio que a maka reside na fraca promoção dos eventos e na qualidade do “produto” que goza de má reputação (se calhar com razão). Atendendo o facto da vida financeira dos clubes estar cada vez mais difícil por dificuldades financeiras de alguns patrocinadores que não encontram retorno nas suas parcerias com os clubes, é urgente apostar na organização e na qualidade dos jogos e com isto vender melhor o produto para a televisão e para os adeptos.

Não é realista que um clube angolano venda sequer 5% do que vende o Real Madrid em bilheteiras, mas será que vender 1% dos 113,8 milhões de euros que as bilheteiras do Real Madrid arrecadaram para o clube na temporada 2013/2014 são assim tão irrealistas para um Petro ou 1.º D’Agosto?

Merchandising no basquetebol

fonte: FIBA

O Petro de Luanda e o Recreativo do Libolo estão disputar as finais do BIC Basket numa série a melhor de sete jogos. Em termos de exibição as duas equipas têm apresentado bons momentos de basquetebol mas as arbitragens têm sido muito más (sobretudo no três primeiros jogos), ao ponto que motivaram a ira (e arruaça) dos adeptos do Petro de Luanda que acusam os árbitros de parcialidade.

Se os árbitros continuarem a ser protagonistas das finais pelo pior, quem perde é a modalidade. O jogo precisa de ser limpo para que os adeptos tenham interesse em associar-se a ele e para que os patrocinadores juntem o seu nome ao jogo.

Num situação normal as marcas não querem fazer parte de um jogo em que os erros sistemáticos dos árbitros e a violência dos adeptos passam impunes. Um jogo popular, limpo, bem organizado e com estrelas que o representam deve ser um produto apetecível para os meios de comunicação, fornecedores de equipamentos e produtos desportivos e outros agentes económicos.

Enquanto decorre a nossa final, nos Estados Unidos, os californianos Golden State Warriors e os Cleveland Cavaliers do Ohio lutam pelo título da NBA, que esta semana anunciou um contrato com a Nike, que a partir da época 2017/2018 substitui a Adidas como fornecedor exclusivo de equipamentos da NBA, WNBA e NBA D-League. Os termos financeiros não foram revelados mas diz-se o que o contrato valerá para liga, no mínimo, mil milhões de dólares durante 8 anos, sem considerar as compensações individuais das equipas.

A Nike, que também fornece equipamentos à Federação Angolana de Basquetebol, é a principal marca do mundo do basquetebol muito pela constelação de atletas que reúne na sua “família”. A Adidas nunca conseguiu suplantar a marca americana apesar da longa relação que mantém com a NBA, pelo contrário, a aposta nas estrelas só tem vindo a aumentar a quota da Nike que só com os ténis de assinatura de LeBron James vendeu $340 milhões em 2014. A presença global da Nike no mundo do basquetebol começou a ganhar tracção com a associação da marca a Michael Jordan que com a Nike partilha a Jordan Brand. As duas marcas – Nike e Jordan Brand – têm uma quota de 95% do mercado de ténis de basquetebol que vale $4,2 mil milhões nos Estados Unidos (a Jordan Brand tem 58% de quota e vendeu $2,6 mil milhões entre janeiro de 2014 e janeiro de 2015).

Entre nós, pese o interesse dos angolanos pelo basquetebol, encontrar material de merchadising das equipas que participam no BIC Basket e da selecção nacional é uma raridade. Sempre achei curioso o facto da camisola de Carlos Morais mais vista em Luanda ser dos Toronto Raptors e não do Petro, Libolo ou selecção nacional. Até onde sei, se quisesse comprar hoje uma camisola da Nike da selecção de Angola de basquetebol não encontraria a venda em Luanda. Nunca percebi o porquê da inexistência de material oficial das equipas angolanas de basquetebol nas lojas (excluo aqui as lojas oficiais) quando abundam nas ruas das principais cidades de Angola as cores de clubes e selecções estrangeiras.

Não tendo qualquer estudo que suporte a minha posição, penso que o potencial comercial de alguns jogadores está a ser subaproveitado pelos clubes e pela federação e, como se pode observar no caso de Jordan, as estrelas do passado podem igualmente ser aproveitadas como, por exemplo, Jean Jacques da Conceição, José Carlos Guimarães, Necas, Paulo Macedo, Víctor de Carvalho, Miguel Lutonda, etc.

No caso da federação, seria proveitoso retirar mais da relação com a Nike sobretudo a nível da sua capacidade de comunicação com o mercado. Para os clubes, existe espaço para melhorar o design dos equipamentos, o modelo de comunicação e presença no retalho. A elaboração de uma estratégia de comunicação pode ser cara e a solução poderia passar pelo desenho de uma estratégia conjunta para a modalidade/liga em que os custos fossem partilhados entre os diferentes agentes.

Os agentes desportivos angolanos não podem continuar a dar-se ao luxo de depender excessivamente dos seus patrocinadores enquanto ignoram as oportunidades que a demografia lhes oferece, quem sabe este momento de maior aperto financeiro seja o empurrão que faltava para que os méritos do merchandising sejam abordados de outra forma no nosso basquetebol.

NBA em África e Angola

fonte: NBA

A NBA é das ligas desportivas profissionais mais populares do mundo. As principais estrelas da liga que junta vinte e nove equipas dos Estados Unidos e uma do Canadá são familiares para a generalidade das pessoas que acompanham desporto no mundo. A liga americana anunciou que vai realizar pela primeira vez um jogo em África e não será na terra da selecção multi-campeã africana em selecções masculina e feminina de diferentes categorias e clubes masculinos e femininos, o jogo será na África do Sul.

Angola ambiciona ser uma potência continental nos domínios político, económico, cultural e desportivo e – no âmbito do desporto – este objectivo já foi alcançado há muitos anos no basquetebol. O domínio do basquetebol é explicado pelo trabalho feito há muitos anos por indivíduos e instituições ligadas ao basquetebol, pela popularidade da modalidade no país e pela liga que, apesar das limitações e insuficiências, produz o basquetebol mais competitivo (e competente) no continente, facto que pode ajudar a explicar o número reduzido de basquetebolistas angolanos lá fora uma vez que é possível fazer uma carreira bem remunerada em casa. Com efeito, nunca um atleta angolano disputou um único jogo da época regular da NBA (Carlos Morais foi o que esteve mais perto) e com a melhoria das condições (sobretudo a nível financeiro para os atletas) cada vez há menos angolanos a jogar profissionalmente na Europa.

Contudo, Angola parece padecer de um “síndrome de VIP”, ou seja, “sou demasiado importante para ir ter contigo, venha tu ter comigo”. Esta atitude é transversal na forma em que fazemos política, quer seja económica ou desportiva. Somos muito fechados e pouco pro-activos, gostamos de ser paparicados e do beija-mão porque a humildade (ou será realidade?) não combina connosco.

As relações internacionais do basquetebol angolano continuam muito centradas na Europa, os intercâmbios oficiais com a sede da modalidade, os Estados Unidos, continuam a ser invisíveis apesar de estarmos numa posição privilegiada, uma vez que a modalidade goza entre nós de uma popularidade inigualável em África. Temos hoje clubes que suportam atletas em idade escolar nos Estados Unidos (Petro e D’Agosto) mas falta um envolvimento maior da federação e que esta relação não se limite a enviar jogadores jovens para os Estados Unidos, é preciso envolver treinadores de um lado e do outro e aprender com os melhores a forma de organizar o espectáculo e gerir os activos. Uma relação mais intensa com o mundo do basquetebol americano seria um empurrão para que o nosso jogo desse o próximo passo: ser mais competitivo nos mundiais e torneios olímpicos.

Luanda é a capital do basquetebol africano, a cidade com mais clubes campeões no continente (masculino e feminino), sede da federação mais ganhadora de África e onde mais gente pratica a modalidade nas ruas. Contudo não é aqui que estão os escritórios da NBA África, que efectivamente já organizou eventos em Angola a partir dos seus escritórios em Joanesburgo, na África do Sul.

Com maior pro-actividade poderíamos intensificar o intercâmbio com a federação americana (USA Basketball) e com a NBA e estaríamos posicionados para sermos considerados para um jogo semelhante ao que se realizará em Joanesburgo, a terra do rugby e do futebol, onde o principal pavilhão serve sobretudo como casa de eventos culturais. No primeiro dia de Agosto opõem-se em Joanesburgo o Team Africa capitaneado pelo sul-sudanês naturalizado britânico Luol Deng (Miami Heat) e o Team World capitaneado por Chris Paul (Los Angeles Clippers) na Ellis Park Arena que tem uma lotação de cerca de 6.300 pessoas.

A NBA sentiu-se atraída pela África do Sul pelas condições que o país oferece, apesar da fraca popularidade da modalidade na África do Sul a capacidade económica e nível de desenvolvimento do país acabam por falar mais alto do que, por exemplo, a nossa história no basquetebol que é um activo que poderia ser melhor aproveitado. Com melhor diplomacia este jogo poderia ser no raramente utilizado Pavilhão Multiusos do Kilamba perante 12.750 pessoas em oposição de 6.300 da Ellis Park Arena.

Temos que valorizar o que o nosso basquetebol conquistou mas é preciso sermos humildes e empreender mais esforços na construção de uma relação frutuosa com a maior organização do mundo do basquetebol: a NBA (não, não é a FIBA). E se eles (NBA) “insistem” em não tomar iniciativa, que sejamos nós a tomar.