Os últimos dados previsionais da economia angolana publicados pelo FMI (abril 2017) são preocupantes mas, infelizmente, não são surpreendentes. Olhando para as potencialidades de Angola não restam dúvidas que somos um underachiever, ou seja, estamos muito abaixo do nosso potencial e a culpa é nossa, mas para quem não quer partilhar patrioticamente a culpa o ideal é apontar o dedo aos políticos angolanos cujas decisões estão a limitar o país à este estado medíocre e, de certa forma, vergonhoso.

Quando Angola se tornou independente foram tomadas várias decisões que ditaram o nosso percurso tortuoso até às primeiras tentativas de construção de uma economia de mercado que não correram bem e este período foi todo feito com uma guerra civil destruidora em vários sentidos como pano de fundo. Em 2002 tivemos a nossa grande oportunidade para dar a volta construindo uma democracia equilibrada e uma economia sustentada pela livre iniciativa, com menos presença do Estado, com menos compadrio e mais valorização do mérito mas não, embarcamos numa festa regada à petróleo caro que deu para todo tipo de excentricidades e para inaugurar a década de 2010 decidimos fazer uma nova Constituição, um fato que se a maioria dos angolanos vestir não ficará bem.
A nova carta directora da nossa vida política, social e económica não trouxe o contrato social ideal para construção de uma nação próspera e estável, pelo contrário trouxe acoplado um contrato social desequilibrado, agravado pela aplicação inconsistente e injustificavelmente parcial das tais leis que estão longe do ideal mas que se fossem aplicadas “ao pé da letra” teríamos certamente outro cenário social em Angola. Uma das questões previstas na Constituição com potencial transformador que continua a ser negligenciada é a realização de eleições autárquicas que prometem finalmente afastar o país desde modelo de gestão local desalinhado com o mundo moderno e divorciado dos interesses dos angolanos.
O foco nas nossas riquezas minerais demonstra que não nos conseguimos livrar da lógica que todo valor vem do subsolo, desprezando a necessidade de formar com qualidade os angolanos para que possam empreender competitivamente nas mais diferentes áreas, incluindo na exploração mineira. Ao longo desses anos todos de bonança o investimento em educação focou-se na construção de escolas, quase todas amarelas reluzentes, inauguradas com pompa e circunstância para dias depois serem ocupadas por directorias mal financiadas e com limitações de gestão com o seu exército de professores mal formados com salários em atraso. Autênticas fábricas de alunos com formação deficitária.
O capitalismo de campeões escolhidos à dedo por uma elite política produz invariavelmente uma sociedade instável, onde a elite política sente-se tentada em manter a ”estabilidade” por via da intimidação no lugar da boa governação. A sociedade avança com os incentivos errados, envenenada pela corrupção e com uma classe empresarial capturada pelo modelo do capitalismo de compadrio, em que triunfam os que usam a “cor certa” e não necessariamente os que produzem o que o mercado considera ser acertado. Todas as pessoas têm o direito de empreender mas não é bom sinal quando a lista dos maiores empresários de um país coincide com a lista de políticos destacados e seus parentes, este desenho aristocrático de uma sociedade é uma receita para sub-produção económica e, quase sempre, instabilidade social.
Os números previsionais do FMI não são uma fatalidade, mas é muito provável que se venham a confirmar se entretanto não forem feitas reformas estruturantes. Não há volta a dar, temos que mudar de caminho e não falo em mudar de faixa porque o que precisamos é de dar uma volta de 180 graus e avançar. Criar um modelo de organização política em que exista equilíbrio entre quem governa, quem faz leis e quem administra a justiça.
A economia deve ser um concurso de qualidade e não de amizade, as escolas devem formar e não ser um passatempo e o poder local deve ser subordinado ao voto local e temos que dar uma oportunidade às ideias liberais que incrivelmente continuam a encontrar resistência inclusive nos países percursores apesar dos resultados. Vamos abrir o país e evitar a postura de desconfiança de quem vem de fora porque quanto mais dificultamos o acesso ao nosso mercado mais estamos a convidar o pior tipo de investidor externo que existe: oportunistas disponíveis a tudo para subirem ao topo ao mesmo tempo que afastamos quem prefere valer-se simplesmente pelo trabalho e está na hora de admitirmos que não vamos conseguir crescer sem investimento externo em quantidade e qualidade.