Dívida pública e os 60% do PIB

Segundo o FMI, reportado pelo jornal Expansão, o rácio Dívida Pública/Produto Interno Bruto rompeu em 2015 a barreira dos 60% que é o limite estabelecido pela lei.

Pelas contas do FMI, Angola terminou o ano passado com uma dívida pública bruta de 7,7 biliões Kz, equivalente a 62,3% do PIB de 12,3 biliões Kz. Em dólares,o endividamento angolano ascendia a 64,2 mil milhões USD para um PIB de 103 mil milhões USD, que vai dar os mesmos 62,3% do produto.

in Expansão

Os 60% do PIB como dívida excessiva se tornaram num lugar comum sobretudo por estarem plasmados no Tratado da União Europeia que estabelece que qualquer valor deste rácio que seja superior a 60% deve ser considerado excessivo.

Ao abrigo do Tratado da UE, um défice orçamental de mais de 3% do PIB é um défice excessivo. Ainda ao abrigo do Tratado, a dívida pública é considerada excessiva se exceder 60 % do PIB e não registar uma diminuição a um ritmo adequado (definido como uma diminuição do excesso de dívida em 5 % por ano, em média, ao longo de três anos).

Comissão Europeia (ec.europa.eu)

A sustentabilidade fiscal segundo o Tratado da UE pode ser resumida no cumprimento de dois critérios: (i) défice fiscal não superior à 3% do PIB e  (ii) dívida pública não superior à 60% do PIB. Mas estas regras estabelecidas sob o pensamento one fits all  não podem ser encaradas como uma luva para todas as mãos, inclusive dentro das fronteiras da UE a sua globalidade é muitas vezes questionada.

A realidade demonstra que existem estados que conseguem suportar níveis de dívida pública superiores à 60% do PIB e outros nem tanto. Contudo, a nível internacional o número 60% continua a indicar sustentabilidade fiscal mas eu começo a ter dúvidas sobre a nossa capacidade de sustentar tais níveis de endividamento. No caso angolano, na estratégia para saída da crise do governo de Angola é avançado um indicador para a capacidade do estado pagar as suas dívidas: 38 dólares com preço mínimo para o barril de petróleo, ou seja, considerando os preços médios a que vendemos o nosso petróleo entre Janeiro e Março, o estado não consegue servir a dívida pública nos termos acordados com os seus credores.

OilBreakEven
Fonte: Ministério das Finanças

O estado angolano tem vindo a acumular dívida – angariada dentro e fora do país – à um ritmo impressionante que demonstra, sobretudo para dívida angariada junto de instituições estrangeiras, que existe confiança na capacidade do estado angolano pagar a dívida apesar do preço de exportação do barril de petróleo nos últimos três meses colocar Angola numa posição complicada segundo os cálculos do governo.

Quanto ao limite legal de 60% do PIB para a dívida pública e em face do passo acelerado em que o governo está a fazer crescer a dívida pública, parece que o executivo está confortável com níveis de endividamento superiores e a maioria parlamentar confortável permite o aumento da dívida sem uma acirrada negociação parlamentar. Tudo indica que nos próximos tempos a barreira dos 60% será largamente ultrapassada não só porque o numerador está a aumentar (a dívida) mas também porque o denominador (o PIB) está deprimido e a moeda de denominação base está a desvalorizar-se sendo que o mix da dívida pública inclui valores em dólares e euros. Assim, com menos entrada de fundos, servir a dívida tornar-se-á cada vez mais difícil.

O indicador dos 60% não conta a história toda da sustentabilidade da dívida, o que importa é perceber se o estado tem capacidade para gerar receita pública suficiente para pagar o que deve e em que sentido se move a economia. Com menos crescimento do sector privado, com mais desemprego, menos exportações e menos importações fazer crescer a receita fiscal vai ser complicado e a via dos impostos indirectos está provavelmente esgotada sobrando a revisão dos impostos sobre rendimento de sectores económicos muito rentáveis mas com tributação relativamente baixa como os sectores financeiro e de telecomunicações.

O governo deverá angariar dívida para melhorar a capacidade produtiva da economia e não necessariamente para pagar contas correntes e assim criar uma bolha que poderá, no futuro próximo, empurrar o país para o incumprimento e aí a palavra se evita como o diabo evita a cruz poderá fazer-se presente: resgate.

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