Inflação não se controla por decreto

O Governo angolano reviu em baixa o crescimento económico para 2019, de 2,8% para 0,4%, o que estampa as dificuldades da nossa economia que se arrastam há meia década e não parece haver uma cura para os próximos anos. Recentemente, um dos maiores sucessos da política económica foi o controlo da inflação conseguido à velha maneira de controlo da taxa de câmbio após vários trimestres de crescimento galopante dos preços (e das taxas de câmbio).

Contudo, a variação cambial não se reflectiu em todos os preços, designadamente nos serviços de telecomunicações e televisão por subscrição e nos preços dos combustíveis. Recentemente, a operadora Zap avançou para uma actualização dos preços porque os pagamentos aos fornecedores externos em divisas não eram compensados pelas mensalidades em kwanzas cuja variação não acompanhou o mercado cambial dos últimos anos. O INACOM com uma medida difícil de defender tentou travar a operadora numa alegada posição de defesa do consumidor, após semanas de um espectáculo evitável o INACOM permitiu a actualização dos preços da Zap e as suas concorrentes na distribuição de televisão por subscrição responderam com o aumento dos preços dos seus pacotes pelas mesmas razões.

Antes da saga da Zap, aquando da apresentação de resultados da Sonangol um administrador da petrolífera deu nota que já teria sido solicitado ao Governo um ajustamento aos preços dos derivados de petróleo porque a variação cambial não se reflectiu nos preços o que obriga a Sonangol a operar com prejuízos que têm que ser compensados com subsídios a preços de produtos que estão alegadamente enquadrados no regime de preços livres desde 2015. O Governo decidiu segurar os preços dos combustíveis porque um aumento do gasóleo e da gasolina terá efeito imediato no nível dos preços.

Outro preço importante na economia é a taxa de juro, o BNA determina taxas directoras e os bancos têm alguma liberdade para acrescentar uma margem sobre as taxas directoras para formar o preço que cobram aos seus clientes. O banco central recentemente, dentre outras medidas controversas impôs limites rígidos a taxa de juro para operações de crédito ao apoio de determinados sectores e a uma série de comissões de serviços bancários. A falta de crença do BNA na capacidade da interacção voluntária entre bancos e seus clientes gerar os melhores resultados para a economia poderá ter efeitos perversos, como redução da rendibilidade dos bancos que serão obrigados a vender um produto abaixo do preço ideal.

A tentativa de limitar o aumento dos preços da Zap, a resistência em ajustar os preços dos combustíveis e a imposição de quotas e de uma taxa de juro obedecem à um padrão que deve estar a ser alimentado por um misto de desespero com crença inexplicável em políticas erradas do passado. Controlar a inflação por decreto não costuma gerar resultados positivos no médio prazo, sobretudo quando se recorre à imposição de preços máximos ao sector privado sem que exista subsidiação  compensatória que permita às empresas manter a máquina a trabalhar. Ao seguir este caminho ao extremo a economia venezuelana colapsou porque o sector privado sucumbiu aos prejuízos e arbitrariedades empurrando milhões para o desemprego e reduzindo para níveis mínimos a oferta de bens e serviços que acabam por ser comercializados acima dos preços desejados pelas medidas dos reguladores.

Não é de todo expectável que a economia angolana deslize para o nível da venezuelana com estas medidas mas não será surpresa nenhuma que a continuidade de medidas de controlo artificial do nível dos preços acabem por deprimir ainda mais a economia, com menos investimento privado e mais desemprego. Por outro lado, é compreensível que o Governo queira evitar o aumento do preço dos combustíveis pela sua transversalidade na economia e pela ausência de mecanismos eficientes para mitigação do aumento dos custos com transporte, mas neste caso os operadores são subsidiados ao contrário do que se pretende com os bancos ou como se pretendia com as telecomunicações e se a moda pega poderemos ver outros sectores a serem visados com limites nos preços que praticam e aí poderá ser o definitivo entornar do caldo.

 

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