Em 2010 um documento do INE (IBEP) indicava que cerca de 78% dos habitantes de zonas urbanas em Angola vivia em habitações de má qualidade e o Censo 2014 revelou que “o lixo é depositado ao ar livre por 59% dos agregados familiares residentes nas áreas urbanas e 87% dos residentes nas áreas rurais”. Estes indicadores exibem as péssimas condições em que vivem boa parte dos angolanos que são agora “convidados” a pagar uma luxuosa taxa de lixo.
Aparentemente o projecto terá abrangência nacional mas o arranque está reservado para a província de Luanda. O governador de Luanda, Higino Carneiro, quando apresentou a medida avançou que a taxa seria associada à factura de electricidade, o que coloca sérias questões sobre a abrangência da taxa uma vez que apenas 32% das residências em Angola tem ligação à rede de electricidade. O Vice-ministro do Ambiente, Sianga Abílio, avançou dias depois que o modelo de cobrança combinará a cobrança por via da factura da luz com a cobrança porta a porta para aqueles que não têm contrato com a ENDE, parece-me uma missão ambiciosa se nos lembrarmos que mais de 70 dos luandense, por exemplo, vivem em musseques não urbanizados.
O modelo do poluidor/pagador é amplamente aceite e no nosso caso consta que está previsto numa lei de 2015, que indica valores bem mais simpáticos do que os que foram apresentados pelo governador de Luanda que se propôs cobrar entre 500 kwanzas e 15 mil kwanzas mensais por habitação e até 150 mil kwanzas mensais para empresas.
Da mesma forma que tenho muitas dúvidas sobre a capacidade de cobrança de forma abrangente do IPU não acredito muito que haja capacidade para cobrar com o mínimo de abrangência a taxa do lixo por manifestas limitações de capacidade técnica por parte das autoridades e por falta de capacidade financeira por parte das famílias.
O empobrecimento das famílias angolanas é acelerado e palpável, o aumento consistente da carga fiscal e da taxa de inflação em nada ajudam a aliviar a situação difícil em que a maioria dos angolanos se encontra o que explica a recepção fria desta proposta do GPL. Ademais, o histórico de ineficiência do sector público angolano adiciona dificuldade à aceitação de tal medida porque as pessoas antecipam que estarão a pagar muito dinheiro para um serviço que será mal prestado, a má reputação sempre será um passivo after all.
Mas as dificuldades de aplicação não se esgotam nos problemas financeiros das famílias, na confiança dos cidadãos e nas limitações técnicas dos organismos responsáveis pela implementação da medida. A desorganização urbana que se espera resolver com o premiado Plano Director Geral Metropolitano de Luanda, é o maior desafio para esta medida e para muitas outras que envolvam cobrança.
Ao longo dos anos o governo de Angola negligenciou a organização das cidades remetendo todas as culpas para guerra civil, estes longos anos em que o desenvolvimento urbano organizado foi esquecido produziram centros urbanos dominados por musseques que funcionam como multiplicadores de problemas sociais, desde a insegurança à problemas de saúde pública. Apesar da gigantesca estrutura do estado angolano as construções cresceram sem lei e órfãs de bom senso, o estado absteve-se da criação de condições para o desenvolvimento urbano organizado e nasceu um monstro que hoje dificulta a governação. Sem urbanização é muito mais difícil construir redes técnicas eficientes, mais difícil fazer policiamento e mais difícil cobrar impostos e taxas por domicílio.
Após meses de muita indecisão e sem alterações positivas no mercado do petróleo bruto o Governo angolano resolveu recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para tentar melhorar a situação. As negociações começam dentro de dias e encima da mesa está uma proposta para um Programa de Financiamento Ampliado (Extended Fund Facility ou EFF em inglês).
Quando um país enfrenta graves problemas de médio prazo na balança de pagamentos por causa de deficiências estruturais cuja resolução exige tempo, o FMI apoia o processo de ajuste por intermédio de um Programa de Financiamento Ampliado (EFF). Em comparação à assistência prestada no contexto do Acordo Stand-By, a assistência no âmbito de um acordo ampliado difere por envolver um programa de maior duração — para ajudar os países a implementar reformas estruturais de médio prazo — e um prazo de amortização mais longo.
Fonte: FMI
O Governo rejeita categoricamente que formalizou um pedido de resgate junto do FMI, enfatizando que o FMI entrará em cena como consultor do governo no desenho de um pacote de reformas que ajudarão a acelerar a diversificação. De facto um EFF não é um bail out, mas possibilita o financiamento à taxas mais favoráveis que as praticadas no mercado e em face do estado débil das finanças públicas o envelope financeiro será bem-vindo.
A quebra gigante das receitas do Estado têm conduzido à sistemáticos atrasos no pagamento de salários a funcionários públicos e acumulação de dívidas a fornecedores, apesar de medidas draconianas para o aumento da receita fiscal que a par da inflação têm estado a castigar o rendimento disponível dos angolanos. Este filme de horror faz crescer a tensão social e a pressão para o aparecimento de soluções, no discurso de parte significativa dos angolanos o Governo tem sido incapaz de resolver a maka e as manifestações de alívio e esperança com o anúncio do início de negociações com o FMI revelam este sentimento.
Por outro lado, depois de ter tomado várias medidas impopulares num curto espaço de tempo (aumento de impostos, redução e eliminação de subsídios aos combustíveis, aumento das tarifas de electricidade e água, etc.) o Governo não quer arriscar novas medidas impopulares, nomeadamente a tão falada redução da função pública, sem ter um consultor para atribuir a autoria da ideia. Assim, o “vilão” passa a ser o FMI que há alguns meses atrás sugeriu ao Governo que reduzisse os custos com a função pública em nome da sustentabilidade das contas públicas.
Seja qual for o formato do pacote de apoio do FMI, será sempre acompanhado de medidas duras tal é o nível de necessidade de correcção que a nossa sociedade precisa para ter uma economia competitiva.
O FMI insistirá certamente na revisão dos custos com funcionários públicos que o Governo espera aliviar com a eliminação de fantasmas, uma missão que expõe o nível de desorganização das instituições públicas angolanas, quer sejam organismos públicos ou empresas públicas como foi o recente caso de pilotos fantasmas na TAAG.
Nos últimos tempos o FMI tem feito várias referências à saúde do sistema financeiro angolano e poderá sugerir medidas que conduzam à consolidação da banca comercial, implicando a liquidação de bancos mais frágeis ou a absorção destes por parte dos mais sólidos. Os técnicos do FMI deverão igualmente recomendar uma nova abordagem para questão cambial, exigindo ainda mais desvalorização uma vez que o kwanza continua sobrevalorizado como abordei aqui e aqui. A nível fiscal fala-se na introdução do IVA como tem vindo a pregar a Associação Industrial de Angola há alguns anos. O FMI poderá ainda pedir que o Estado reduza a sua presença no sector privado e que implemente um programa de privatizações que garanta algum encaixe financeiro e ajude a criar empresas mais eficientes.
Infelizmente, por questões estatutárias o FMI não pode ir muito além de recomendações para reformas económicas e sugestões genéricas para melhorar a qualidade de instituições públicas porque não tem mandato para sugerir mudanças profundas no sistema político dos países que apoia. Esta limitação – apesar dos discursos mais abrangentes de Christine Lagarde – implica que estamos perante a velha lógica que privilegia questões técnicas à questões institucionais na luta pelo desenvolvimento económico o que limita o meu entusiasmo com os resultados no médio/longo prazo desta nova “participação especial” do FMI no filme de terror que se tornou a economia angolana.
O FMI não poderá abertamente pedir ao Governo que abandone a sua filosofia de centralização do poder e de subalternação do poder legislativo. O FMI não poderá abertamente exigir uma reforma na justiça que crie um ambiente mais equilibrado para todos e que esta sirva o seu papel de resolução de conflitos sociais com maior grau de isenção possível. O FMI não pode exigir o fim imediato do sistema de gestão local anacrónico e ineficiente que retira competitividade à economia e qualidade de vida aos cidadãos que são excluídos tanto na escolha dos seus governantes locais como na governação das regiões em que vivem. O FMI não poderá pedir a revisão urgente da política comercial em relação à SADC pese o facto de poder abordar a questão da política de promoção do investimento privado que continua a vender o nosso mercado como um “privilégio para poucos” em flagrante contradição com a realidade. O problema do FMI é que tem que obedecer a velha Xica, não pode falar de política abertamente e o nosso problema é precisamente a vigência de um modelo político que não é amigo do desenvolvimento económico equilibrado e sustentável.
Em 1951 o economista sul-africano S. Herbert Frankel e forte opositor do modelo do apartheid chamou a atenção do mundo para a importância das escolhas políticas no desenvolvimento ou não de uma nação. Vale a pena reler.
O progresso económico depende muito da adopção de acção administrativa e legislativa apropriada por parte dos governos (…) Gostaríamos de enfatizar que as pessoas são influenciadas por aqueles que detêm autoridade sobre elas. Se os líderes são reaccionários, egoístas e corruptos, as pessoas ficam desanimadas, e aparentam não ter iniciativa. Por outro lado, se os líderes ganham a confiança do país, e provam ser vigorosos na erradicação dos privilégios e das grandes desigualdades, podem inspirar as massas com um entusiasmo para o progresso que carrega tudo consigo (…) todos os problemas de desenvolvimento económico são solucionáveis.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) publicou finalmente os números finais do Censo 2014. Entre surpresas boas, novidades inesperadas e confirmação de ideias generalizadas não muito positivas destaco o seguinte:
Esperança de vida a nascença
A esperança média de vida de 60 anos (homens 55,5 e mulheres 63 anos) é para mim a maior surpresa de todas. Toda gente tem a percepção que são raros os angolanos que chegam a velhos mas o Censo 2014 diz que o angolano em média morre mal chega à terceira idade, mas chega lá.
Apesar dos sérios problemas no sector da saúde mas com relativa baixa taxa de sero prevalência Angola passa assim a constar no exclusivo clube de países da região austral e da África Central com o esperança média de vida na casa dos 60 anos.
Fonte: INE, Stats SA, RTC, Namibian, Statistiques Mondiales
Desemprego
A taxa de desemprego é dos mais importantes indicadores de um país, contudo não existe nenhum organismo responsável pela publicação periódica desta taxa em Angola. Espero que o INE assuma esta posição e passe a publicar a evolução da taxa de desemprego em Angola. Segundo o INE, em Maio de 2014 24,2% da população angolana entre 15 e 65 anos não tinha emprego.
Com a deterioração da saúde económica de Angola nos últimos tempos esta taxa é hoje certamente superior à de 2014. Ademais, a comparabilidade internacional da taxa apresentada pelo INE poderá estar comprometida se a população activa não coincidir com a população entre 15 e 65 anos, o que permite antecipar uma taxa de desemprego real superior aos 24,2%.
Idade média e escolaridade
Angola tem uma população extremamente jovem. O angolano médio tem 21 anos, se quisermos comparar com o país com a idade média mais elevada do mundo, o Japão, nós temos em média menos 24 anos. Contudo, os números da escolaridade não são muito animadores, o exército de jovens angolanos tem uma taxa de frequência escolar baixa e nem precisamos entrar no capítulo da qualidade do ensino.
Mais de 23% das crianças entre 5 e 11 anos não frequenta a escola e 48% da população com mais de 18 anos nunca frequentou a escola ou concluiu a sexta classe. Assim é difícil construir uma base produtiva para levar o país para outros voos, estamos antes a criar uma população com sérias limitações cuja criatividade é desaproveitada por falta de educação formal.
Nação de agricultores
Estatisticamente Angola é uma nação de agricultores. O Censo indica que 46% dos agregados familiares praticam agricultura. Este número expressivo obriga-nos a questionar o porquê do crónico sub-abastecimento de produtos agrícolas nacionais que leva o país a importar milhões de toneladas de alimentos todos os anos. O contraste dos números demonstra o grave problema de produtividade nacional que resulta de uma série de factores que precisam de ser corrigidos com urgência como formação e défice de infra-estruturas.
Acesso à água e electricidade
Falando em infra-estruturas, o Censo 2014 deixa pouca margem para manobras. O número de angolanos com acesso água e luz eléctrica da rede é muito baixo.
Cerca de 56% dos angolanos não tem acesso à água apropriada para beber, sendo que nas zonas urbanas 57,2% têm acesso a água apropriada e apenas 22,4% nas áreas rurais. Com estes números não nos podemos surpreender com as makas de saúde pública que temos.
A fiabilidade da rede eléctrica nacional é muito má. A qualidade e a quantidade de electricidade fornecidas pela rede deixam muito a desejar e para piorar este cenário, apenas 31,9% dos agregados têm acesso à electricidade da rede. Mais de 9% dos agregados têm o gerador como principal fonte de iluminação e 31,6% recorrem à lanternas como fonte principal. Em 2016, 14 anos em paz, temos que apresentar números melhores que estes.
Angolanos, estrangeiros e religiosidade
Angola tem menos estrangeiros do que eu pensava. Dos 25,8 milhões de habitantes que viviam em Angola em 2014 apenas 586 mil eram estrangeiros (2,3% da população) e 40% destes viviam em Luanda. Com efeito, 4 províncias (Luanda, Lunda Norte, Cabinda e Zaire) concentram 88% dos estrangeiros que vivem Angola.
O país continua a ser esmagadoramente cristão sendo que 79,2% da população apresenta-se como cristã (41,1% católicos e 38,1% protestantes). Os muçulmanos são 0,4% e judeus 0,2% e 12,3% da população não pratica qualquer religião.
A solidariedade é importante. Numa sociedade é fundamental que exista o hábito de apoiar, que exista compaixão. Contudo, na vida de uma sociedade, mais importante que solidariedade é responsabilidade.
Como o homem é um ser egoísta por natureza, apesar dos apelos para amarmos o próximo como a nós mesmos a nossa natureza coloca sempre o “eu” na frente de tudo. Tendo presente esta realidade ao longo da história da humanidade foram sido criadas normas de organização social que buscam limitar o impacto das nossas acções egoístas que prejudicam o bem estar de outros, os economistas chamam a isto de externalidades, ou seja, o impacto das nossas acções no bem-estar de terceiros.
Para limitar as externalidades negativas o homem criou mecanismos judiciais que devem ter como objectivo manter o equilíbrio social. Por isso, é importante que exista responsabilização caso falhe a responsabilidade.
O grande problema de Angola é precisamente a responsabilização. Vezes sem conta as autoridades falham com o cidadão mas por mais identificadas que estejam as causas e autores o normal é não acontecer nada. Os angolanos são forçados a aceitar a incompetência, a mediocridade e, sobretudo, a irresponsabilidade. Este sistema tem custos elevados no longo prazo porque não cria mecanismos de correcção por via da punição, reina a irresponsabilidade até ao ponto de exaustão. Ponto em que hoje nos encontramos, o sector da saúde é só a “miss do mês” mas se olharmos de perto, a fracturas são visíveis em todos os sectores da nossa vida social como educação e infra-estruturas.
A maior parte dos angolanos não tem acesso à outros hospitais que não os públicos cuja qualidade se vai deteriorando dia após dia com falta de tudo, de pessoal à material gastável. Estamos num país em que os “sortudos” quando adoecem não vão para o hospital, vão para o aeroporto. Estamos num país em que uma geração de filhos dos filhos dos que algo têm são “angolanos nascidos no exterior” porque para muitas pessoas um parto em Angola é demasiado arriscado e um desafio ao juízo. Apesar da gravidade desta realidade, isto não tem sido nem debatido nem responsabilizado.
O número elevado de mortes recentemente registado e reportado no Hospital Pediátrico David Bernardino em Luanda fez soar o alarme que deveria ter soado anos atrás ou, se quisermos ser mais simpáticos, poderia ter soado quando em Junho de 2015 o New York Times publicou a reportagem de Nicholas Kristof “Angola: The World’s Deadliest Place for Kids”. Mas não, depois da reportagem que expôs a gravidade do estado do sistema de saúde em Angola alguns formadores de opinião escolheram descredibilizar a reportagem e hoje cá estamos, gritos e mão na cabeça.
A igreja Católica lembrou o país recentemente dos efeitos da falta de ética e de solidariedade na nossa sociedade, foi uma mensagem importante e o país será melhor se for amplamente acatada. Neste momento de extremo sofrimento para muitas famílias, todo apoio é importante mas para uma solução duradoura temos que mudar a forma de gestão da nossa sociedade.
O KFC Index (gratuito aqui) procura replicar o modelo do Big Mac Index para calcular as taxas de câmbio ideais com base na teoria do preço único, servindo-se de um único produto como cabaz de comparação, no caso um balde com doze pedaços de frango frito da cadeia de restaurantes Kentucky Fried Chicken (KFC).
No mês de Janeiro de 2016 usei a mesma lógica – tendo a gasolina como produto base – para aferir se a nossa taxa de câmbio deveria ir mais para norte ou mais para sul. Na altura, aproveitando a variação cambial do fim do ano e o ajuste nos preços dos combustíveis comparei o preço da nossa gasolina com o preço da gasolina nos Estados Unidos e concluí que o kwanza estava 66,7% acima do seu valor ideal comparando com o dólar.
A Sagaci Research diz que o kwanza (Fevereiro 2016) está cerca de 72%* sobrevalorizado em relação ao dólar, ou seja, para chegarmos à uma taxa de câmbio de equilíbrio o BNA teria que desvalorizar (muito) mais ainda a nossa moeda aumentando assim a pressão inflacionária e a destruição do poder de compra do angolano, enquanto o aumento da produção nacional (a dita diversificação) não chega para reduzirmos a nossa exposição ao mercado externo, ao qual recorremos para tudo independentemente do grau de sofisticação do produto ou serviço, tal é a nossa incapacidade de produzir internamente.
Fonte: “KFC Index Feb 16”, Sagaci Research
Um elemento interessante no estudo da Sagaci Research é o cálculo do mesmo índice usando as taxas de câmbio do mercado paralelo. Para o kwanza foi usada a taxa de 440 kwanzas por cada dólar sendo que usando esta taxa concluiu-se que no paralelo pede-se mais que a taxa de equilíbrio uma vez que a taxa de câmbio USD/AOA 440 a moeda está subvalorizada em 38%, desta forma, a correcção ocorrida no paralelo nos últimos dias aproxima a taxa das kínguilas da taxa de equilíbrio.
Fonte: “KFC Index Feb 16”, Sagaci Research
No curto prazo, sem aumento de influxo de divisas para gestão mais folgada da taxa de câmbio, a melhor maneira de estabilizar o kwanza sem esvaziar o saco de Reservas Internacionais Líquidas é desvalorizar a moeda de forma agressiva, sendo que os maiores riscos são o aumento vertiginoso dos preços e uma perda de confiança no kwanza que crie uma espiral depressiva que leve o valor da moeda para níveis ainda mais assustadores. Resumindo: o BNA e todos os outros intervenientes na política monetária de Angola têm em mãos uma batata quente.
* a Sagaci terá usado a taxa de câmbio oficial do BNA a qual têm acesso apenas os bancos comerciais, se considerarmos a margem de 3% dos bancos comerciais a taxa não seria 157,9 kwanzas por cada dólar mas sim 162,6 kwanzas por cada dólar o que implicaria que o kwanza estaria sobrevalorizado em 68,8% e se usarmos a mais recente taxa que os bancos oferecem aos clientes de 164,5 kwanzas por cada dólar a grandeza da sobrevalorização do kwanza seria 66,9%, praticamente igual à apresentada neste blogue em Janeiro: 66,7%.
Eu acredito nos mercados mas tenho presente que os operadores, se forem reunidas as condições, tendem a abusar do seu poder de mercado. Assim, é fundamental que exista regulação eficiente mas devemos igualmente evitar que a regulação seja asfixiante ou mesmo despropositada.
Nos últimos dias o governo angolano tem expressado a necessidade de maior fiscalização dos preços porque, segundo representantes do estado, os distribuidores estão a restringir deliberadamente as quantidades que vendem para assim poderem aumentar os preços.
O governo tem avançado com algumas soluções difíceis de implementar e que ignoram por completo o poder do mercado. O diagnóstico feito pelo governo da origem da tendência inflacionária que vivemos hoje parece igualmente ignorar alguns desenvolvimentos recentes da economia angolana como a quebra do valor das exportações que reduziu a entrada de divisas e forçou a desvalorização do kwanza tornando as importações mais caras, a consequente redução das importações que devido a nossa dependência de produtos importados levou à uma forte quebra na oferta que naturalmente pressiona os preços para cima. Pelo meio houve um aumento sensível do preço dos combustíveis e os efeitos são transversais.
No meu ver, a grande função das regras de convivência social, quer sejam informais ou formais é prevenir que algum actor abuse do sistema, quer por falhas sistémicas quer pela sua capacidade de utilizar algum poder que tenha. Esta apetência pelo abuso de poder é um instinto da humanidade e a regulação deve servir para bloquear e punir tais instintos.
Provavelmente existem alguns operadores em Angola com grande poder na oferta de determinados produtos e não há mal nenhum que sempre que for pertinente sejam feitas investigações para apuração de possíveis abusos mas assumir que a escassez de produtos e consequente subida dos preços é malandrice dos importadores parece ser redutor e de certa forma falacioso.
O governo quer travar a inflação por decreto e demonstra pouca crença nas forças do mercado. O sector da distribuição alimentar em Angola é dos mais concorrenciais que temos e isto dificulta o abuso do poder de mercado de forma consistente a não ser que exista um cartel. Caso não exista poder monopolístico e existam bens no mercado, as margens anormalmente altas são insustentáveis porque a dinâmica do mercado corrigirá os preços. Deste modo, o governo deveria focar-se na identificação de possíveis abusos de poder de mercado e cartelização em vez de elaborar uma extensa lista de preços fixos e vigiados ou levar a cabo impraticáveis acções de fiscalização de preços in loco.
Na segunda metade do século XVIII os colonos da América do Norte popularizaram a frase “No taxation without representation” (“não à tributação sem representação”) numa batalha contra a tributação do Parlamento Britânico que os colonos diziam não os representar.
Anos mais tarde, já no século XX, Milton Friedman afirmou que “inflation is taxation without representation” ou seja: “a inflação é tributação sem representação”. Friedman acertou na mosca, a inflação é provavelmente o mais eficiente dos impostos porque dela os consumidores não conseguem escapar. A inflação é pois, um imposto sem necessidade de representação ou legislação.
O governo angolano tem estado a aumentar impostos com o objectivo de tapar os buracos deixados pela redução da receita fiscal sobre a produção e exportação de petróleo, focando a sua missão no aumento de impostos indirectos sobre o consumo e produção, taxas consignadas e impostos sobre a propriedade, ou seja, o “alvo” do governo são os produtores locais e as famílias que em si já estão a levar porrada da inflação que é hoje o papão dos rendimentos dos angolanos.
Os últimos números oficiais indicam que a inflação em Angola anda nos 14,27%, mas o aumento do preço dos combustíveis associado à desvalorização do kwanza e as persistentes dificuldades na importação de bens estão a contribuir para o aumento do passo da taxa de inflação. Os relatos (e imagens) da subida galopante de alguns bens essenciais são preocupantes porque a par do desemprego, a inflação descontrolada é uma das maiores ameaças à estabilidade social.
As economias precisam de consumo e as sociedades dominadas por uma vasta classe média tendem a ser mais estáveis económica e socialmente. No nosso caso, a nascente classe média está ser atacada pela tributação oficial e pela “tributação sem representação”, a inflação. Este facto pode reduzir ainda mais a nossa já minúscula classe média. Assim, apesar da pressão da redução das receitas fiscais do petróleo o estado começa a ser pressionado a rever a sua nova abordagem fiscal dominada pelo aumento da contribuição fiscal das famílias uma vez que existe o risco de aumento da contestação social.
Se os cidadãos podem fugir aos impostos ninguém que consome consegue livrar-se da inflação e a tendência para aumento descontrolado dos preços tem que ser o foco da política monetária mas está a ficar claro que o BNA está a ficar sem instrumentos para controlar os preços. A académica teoria de absorção da liquidez pouco pode fazer para esfriar os preços de bens essenciais cada vez mais escassos.
Se os monetaristas defendem que a base da inflação é a massa monetária, em economias pouco maduras e altamente dependentes de importações de bens essenciais um choque cambial pode conduzir à um choque da oferta e, consequentemente, à aceleração dos preços. A dimensão do choque pode significar níveis absurdos de inflação e desequilíbrios sociais difíceis de gerir como (i) diminuição acentuada do poder de compra, (ii) empobrecimento. (iii) desemprego e (iv) insegurança. Os números oficiais do INE ainda não reflectem um aumento descontrolado dos preços mas os preços nos supermercados e armazéns contam outra história.
A crise económica que acordou boa parte dos angolanos de um sonho, criou milhões de devotos da “Nossa Senhora da Diversificação” levou o Governo de Angola a elaborar uma “Estratégia para Saída da Crise Derivada da Queda do Preço do Petróleo No Mercado Internacional“. As linhas mestras apresentadas pelo governo trazem boas ideias e transmitem a vontade de virar a página, contudo não estão livres de velhas ideias falhadas.
O documento revela alguns dados interessantes que ajudam a compreender a gravidade da maka das divisas.
O BNA vendeu US$ 18.728,4 milhões no mercado cambial primário, em 2014, e em 2015, 16.351,3 milhões de dólares, o que perfaz uma média mensal em torno de US$ 1.486,5 milhões.
De notar, entretanto, que adicionalmente em 2014, os bancos comerciais adquiriam às empresas petrolíferas um montante estimado em US$ 15.288 milhões, o que de facto significa que o mercado cambial nesse mesmo ano movimentou 48% mais de divisas, num total de US$ 31.639,3 milhões, contra US$16.351,3 milhões registados em 2015.
Isto é, o sistema financeiro angolano disponibilizou 48% menos dólares em 2015 do que em 2014 quando os bancos comerciais além de comprar dólares ao BNA compravam também às empresas petrolíferas. Esta equação mantinha-se equilibrada com um certo nível de preço para os barris de petróleo e com a alteração desta realidade a entrada de divisas caiu a pique uma vez que praticamente só exportamos petróleo.
Ao longo da sua história independente, durante vários períodos desta história de quatro décadas, Angola falhou o objectivo de diversificar a economia e, sobretudo, diversificar a carteira de produtos que exporta reduzindo assim a exposição ao petróleo. Sendo a nossa história económica como país independente marcada pela economia planificada e pela guerra civil, a nossa melhor oportunidade de realmente lançar as bases para a diversificação foi a década de 2000 quando alcançámos a paz e atravessámos um contexto económico externo favorável. Contudo, na década de 2000 não foram só vitórias no campo político e económico, a década foi igualmente marcada por um modelo de desenvolvimento obcecado com o hardware (e muitos de qualidade duvidosa), de investimento público pouco criterioso e da subvalorização de áreas-chave como a formação de técnicos com qualidade.
No presente, e olhando para o futuro, o governo compromete-se com investimentos que contribuam para o aumento da produção de investimentos privados e para mim é um bom princípio.
Nas circunstanciais actuais os investimentos públicos deverão concentrar-se cada vez mais nos projectos estruturantes provedores de bens públicos e promotores da diversificação da economia, sobretudo daqueles que contribuem para a viabilização e aumento da produtividade dos investimentos privados.
Os investimentos públicos não devem replicar cegamente projectos coloniais inacabados, o tempo é outro. Os investimentos públicos não devem ser utilizados como instrumento para criar ricos sem mérito, mas sim para melhorar a condição social das pessoas e criar riqueza. Construir estradas de má qualidade e sem contratos de manutenção não é investimento, é aldrabice. Um estado que investe sem critério e permite o abuso de servidores públicos sem consequências não está a criar um futuro melhor, está a criar instabilidade social. Se o princípio que indica a nova filosofia para realização de investimentos públicos for cumprido, certamente teremos uma economia mais eficiente no futuro.
Infelizmente, muitos investimentos falhados nos últimos anos foram privados, muitos com grande apoio institucional e até financeiro do estado. Para estes projectos é igualmente fundamental repensar os apoios e , sobretudo, a selecção. Aparentemente, o governo está disponível para repetir a dose do apoio, desta feita com recurso à financiamento angariado para projectos públicos.
Deverão utilizar-se os saldos de linhas de crédito existentes, estimados em 5,47 bilhões de dólares americanos, antes contraídas para fins públicos, para financiar projectos privados de elevada rendibilidade e que sejam promotores da diversificação da produção e das exportações.
O ser humano (ou o economista) por dificuldade em prever o futuro, recorre ao passado para projectar o futuro e julgando o passado do governo angolano, tenho reservas sobre o sucesso desta intenção de financiar projectos privados com fundos públicos (em dívida). Contudo, desejo boa sorte.
Falando em passado, parece que o governo não abandonou as suas raízes socialistas e continua a acreditar no dirigismo como remédio para os nossos problemas económicos.
Os investimentos devem ser feitos na base de Programas Dirigidos a serem definidos pelo Executivo, com vista a aumentar a produção interna com vista ao aumento das exportações a curto prazo e ao aumento dos produtos da cesta básica e outros produtos essenciais para o consumo interno e para as exportações
Existe alguma razão científica ou histórica para acreditar que os “Programas Dirigidos definidos pelo Executivo” terão mais sucesso que a liberdade de escolha dos milhões de investidores e empreendedores? Não será a livre interacção entre agentes económicos o melhor guia para construção de uma economia concorrencial eficiente e produtiva?
Pelo meio, há uma parágrafo interessante:
O exercício de sensibilidade da dívida existente indica como breack even para o equilíbrio mínimo do Serviço da Divida um preço do barril de petróleo de US$ 38,00. Abaixo deste preço será necessário restruturar a carteira da divida.
Ou seja, neste momento com petróleo a negociar abaixo dos 38 dólares, o serviço da dívida pública está em desequilíbrio e segundo o autor “será necessário restruturar a (…) dívida”. Não é detalhado qualquer plano de restruturação da dívida nem indicado se envolve a totalidade ou apenas parte da dívida.
O documento indica caminhos que ajudarão o estado a poupar nas despesas e a ser mais eficiente daqui para frente, como a limitação ao mínimo de compras de carros de alta cilindrada e o recadastramento do pessoal público civil, militar e paramilitar para que se ponha termo à maka dos funcionários fantasmas que oneram as contas públicas numa grandeza ainda desconhecida.
Na política monetária, não parece que é desta que o kwanza é atirado para o “mundo selvagem das moedas flutuantes”. O BNA continuará a ser dependente da orientação política do executivo e o kwanza continuará a ser uma moeda gerida, não se vai seguir o caminho da Rússia e do Azerbaijão que no meio de crises semelhantes soltaram as suas moedas. Prefiro sistemas em que a política monetária é independente (mas não indiferente) da política fiscal, mas compreendo que o momento não é o melhor para a “liberdade incondicional” do kwanza mas maior flexibilidade (“liberdade condicional”) seria bem-vinda, se calhar até é inevitável.
Com efeito, devem ser desenhados pelos respectivos sectores os Programas Dirigidos destes produtos, traze-los para o circuito normal de exportação e garantir a entrada de cambiais no país.
A frase acima demonstra duas coisas: (i) o governo acredita no dirigismo e (ii) tem noção que existe o risco dos exportadores parquearem as divisas lá fora. Para travar este impulso dos potenciais exportadores o governo tenciona garantir que as divisas associadas à exportação entrem para a nossa economia, mas não indica como. Na verdade, a vontade de parquear divisas lá fora prende-se com a desconfiança no futuro do país. Os agentes temem arbitrariedades que limitem a circulação do seu dinheiro e prejudiquem a execução das suas escolhas, esta confiança demora para ser construída e no nosso caso necessitará de uma mudança de paradigma.
Temos que começar a colocar o poder das instituições no centro do poder e criar um sistema político-económico equilibrado, justo e previsível. Sem confiança e sem lucros astronómicos potenciais atrair investidores será difícil, apenas mudanças profundas a nível institucional voltarão a colocar Angola na rota do investimento externo.
A necessidade de investimento externo deve obrigar o governo a baixar a bola e ser mais aberto, a integração regional já não pode esperar. O documento indica esta vontade e espero que se materialize.
É essencial proceder à assinatura de Acordos Bilaterais de promoção de comércio com os países potenciais compradores, em particular os países vizinhos.
Temos que ter presente que o nosso maior problema é estrutural e não se resolve no curto prazo. Estamos a pagar caro por termos investido sem critério e utilizado de forma abusiva o sector público para o enriquecimento ilícito. Ao longo dos anos não demos liberdade e igualdade de oportunidade suficiente à todos criando um ambiente saudável para o florescer de ideias. Criámos uma sociedade de excluídos e privilegiados, um sistema económico amigo de monopólios e oligopólios, abraçámos o compadrio e a mediocridade e demos as costas ao mérito.
A estratégia do governo pouco fala no nosso maior problema de forma directa. O nosso maior problema é sistémico. Não vamos a lado nenhum se seguirmos a filosofia que defende que o desenvolvimento é um problema técnico, observando a história, como defende William Easterly o problema do desenvolvimento é institucional. O mundo está repleto de exemplos, bons e maus e um bom exemplo para nós poderia ser o Peru.
Entre Agosto de 2014 e Janeiro de 2015 a gasolina ficou 167% mais cara e o gasóleo subiu 238%. Durante este período a tarifa do táxi não saiu dos 100 kwanzas. Contudo, é difícil perceber as ditas tarifas porque os passageiros pagam por rota e estas são variáveis, podendo ser de 7 km ou 15 km, com engarrafamento ou com “pista livre”. Acresce que os taxistas podem encurtar as rotas em função do clima, trânsito ou outra razão qualquer, o que efectivamente é um aumento do preço.
O modelo do preço fixado pelo governo segue a lógica dos “preços máximos” e não impede ninguém de cobrar abaixo da tarifa nem determina as distâncias mínimas e máximas por rota. Com efeito, existindo um número significativo de candongueiros (e sucedâneos como kupapatas) as condições do mercado podem nos levar à um preço inferior aos 150 kwanzas por corrida, sobretudo se for possível prevenir acções concertadas de fixação de preços por parte dos operadores (cartelização). Vale lembrar que os custos operacionais podem impor limites inferiores aos operadores, sendo que em concorrência quando existe muita oferta os preços aproximam-se dos limites inferiores enquanto que num mercado com um operador ou grupo de operadores (cartel) dominante o preço afasta-se do limite inferior.
Por outro lado, numa situação de preços totalmente livres pelo risco de cartelização e, sobretudo, pela pressão dos custos com combustíveis a tarifa poderia superar os 150 kwanzas por corrida e assim aumentar a penúria das famílias angolanas. Esta possibilidade ajuda a perceber não só a intenção do governo de manter vivo o regime de fixação de uma tarifa máxima como ajuda a explicar a relutância do governo em atender aos sucessivos pedidos dos taxistas para aumento da tarifa. Numa cidade populosa e desorganizada como Luanda, o táxi colectivo desempenha um papel central no sistema de transportes, pelo que, o preço da corrida tem grande impacto no orçamento de muitas famílias.
Desde Setembro de 2014, os preços do gasóleo e da gasolina triplicaram e assumindo diferentes cenários para a nova tarifa, podemos dizer que a tarifa de 150 kwanzas está longe de ser o pior cenário possível.
Os taxistas de outras províncias deverão seguir os passos dos seus colegas de Luanda, no Cunene já foram inclusive aprovadas novas tarifas e sendo o aumento dos preços dos combustíveis uma realidade nacional não se pode esperar por um final diferente noutras localidades. A dona Inflação vai continuar a dar porrada aos habitantes desta terra.
Em termos económicos, o ano 2015 foi dos mais difíceis para os angolanos. Para fechar o ano o Governo de Angola e o BNA resolveram dar um presente amargo aos angolanos, enfatizando assim que, em princípio, 2016 não será melhor.
No último dia de 2015 foi anunciado o fim dos subsídios ao preço do gasóleo e o aumento dos preços da generalidade dos derivados de petróleo. A variação dos preços foi justificada por ajustes nos subsídios e pela actualização da taxa de câmbio oficial que passou para 155,6 kwanzas por cada dólar americano.
O gasóleo passou a custar 135 kwanzas por litro e a gasolina passou a custar 160 kwanzas por litro, os aumentos foram de 80% e 39% respectivamente. O custo com a aquisição de gás butano e petróleo iluminante foi igualmente agravado, o mesmo ocorreu com o combustível usado na aviação, o que permite antever uma subida generalizada nos custos de transporte em Angola.
Ademais, como as necessidades de electricidade da indústria angolana são grandemente suportadas por geradores, o aumento dos custos com combustíveis terá reflexos nos custos operacionais que deverão ser passados para os clientes parcial ou integralmente. Mais inflação à vista.
Os 160 kwanzas por litro de gasolina que os angolanos pagam agora equivalem a 0,99 dólares*. Considerando a lista publicada pelo site Global Petrol Prices reportada a 28 de Dezembro de 2015, a nossa gasolina é hoje 9% mais cara que no Brasil e 23% mais cara que na África do Sul. Comparando com a Arábia Saudita que aumentou recentemente o preço da gasolina mas manteve parte do subsídio, a nossa gasolina é 316% mais cara e se olharmos para a Nigéria que a 1 de Janeiro deste ano deixou de subsidiar o preço da gasolina pagamos 130% a mais por cada litro de gasolina. A Nigéria é um bom ponto de referência pois tal como nós é um produtor africano que colmata o défice de refinação interna com importação de produtos refinados e tem um preço livre de impostos sobre o consumo (nós ainda não aplicamos o imposto apesar de existir já legislação aprovada).
Estando o preço da gasolina sob o regime de preço livre há algum tempo, parece contraditório que continue a aumentar quando a matéria-prima de base está em queda há meses. Uma das justificações avançadas pelo MINFIN para o “reajuste do preço dos combustíveis” foi a alteração da taxa de câmbio de referência do BNA, pelo que, esta taxa também terá influenciado o aumento dos preços da gasolina (preço livre) embora que 39,1% de aumento supera largamente os 15% de desvalorização do kwanza.
Aparentemente a Sonangol procurou reflectir no preço da gasolina outros custos que terão aumentado mas estes eventuais custos adicionais não foram especificados pela empresa. Outra hipótese poderá ser uma antecipação de nova alteração na taxa de câmbio no futuro próximo.
Com efeito, usando a teoria do preço único; (i) considerando a gasolina como único produto do nosso cabaz, (ii) admitindo o pressuposto simplificador que a gasolina de Angola é igual à dos Estados Unidos e (iii) recorrendo ao método (simplista e simpâtico) da revista The Economist para o cálculo do The Big Mac Indexpara definição da posição de uma moeda em relação ao dólar dos Estados Unidos, chega-se a conclusão que o kwanza continua sobrevalorizado em relação ao dólar americano e teria que deslizar mais 66,7% para ter uma taxa de câmbio equilibrada, ou seja, a taxa de câmbio ideal seria 266,7 kwanzas por cada dólar**. Como mencionei aqui, o Standard Bank estima uma taxa de câmbio USD/AOA média de 192,3 para este ano, sendo que para o final do ano o Standard Bank estima uma taxa de câmbio USD/AOA de 235. Pois é, a coisa pode piorar.
* para calcular este valor usei a taxa de câmbio estimada da banca comercial: 160,3 (taxa BNA+3%).
** considerando 160 kwanzas por litro de gasolina em Angola e 0,6 dólares por litro nos EUA e dividindo o preço em Angola pelo preço nos Estados Unidos chega-se a uma taxa de câmbio de 266,7.