Como a evolução das receitas fiscais petrolíferas está a matar o optimismo do governo

Há alguns meses atrás, quando o petróleo ainda estava a rondar os 65-70 USD resolvi analisar a sensibilidade da receita fiscal petrolífera de Angola às alterações do preço do barril do petróleo, no caso o Brent. A análise foi alimentada por dados históricos do Ministério das Finanças e prospectivos que constam no relatório de fundamentação do OGE (para as quantidades produzidas).

Considerando a percentagem histórica das receitas fiscais no total da produção/exportação de crude, criei alguns cenários que eram combinados com diferentes níveis de preço para o barril de petróleo, na altura o preço mais baixo que considerei foi $55, que era um valor considerado pessimista. No pior dos cenários, a receita fiscal petrolífera anual – que considera os impostos e as receitas com a concessão – situa-se nos 17,6 mil milhões de USD e é aqui que surge a grande maka.sensibilidade

Até Julho de 2015 o estado angolano arrecadou 830 mil milhões de kwanzas de receitas fiscais petrolíferas contra os 1,8 bliões de kwanzas no mesmo período em 2014. Admitindo linearidade da receita até ao final do ano deverão entrar 1,42 biliões de kwanzas (bilião são 12 zeros!) de receitas fiscais petrolíferas, muito abaixo dos 17,6 mil milhões de USD do meu cenário pessimista, sendo que 1,42 biliões de kwanzas à uma taxa de câmbio média de 120 kwanzas por cada dólar equivalem a 11,9 mil milhões de USD, e isto é um cenário optimista porque a tendência da receita fiscal é decrescente.

Olhando para estes números percebe-se porquê que o FMI aconselha o governo angolano a rever os custos com pessoal da função pública, que eu igualmente considerei exagerados há meses atrás neste blogue. O estado angolano inscreveu no OGE 2015 custos com pessoal no valor de 1,4 biliões de kwanzas, ou seja, se o estado executar na totalidade a despesa com pessoal prevista no OGE o kumbu do petróleo deste ano servirá apenas para pagar o pessoal do estado e nada mais… tudo o resto dependerá de reservas e do aumento da dívida pública.

O estado angolano parece que abandonou o tom optimista do princípio do ano e começa finalmente a ser mais realista nos discursos. Recentemente o governador do BNA disse em entrevista que os cortes têm que ser mais profundos e disse mesmo que somos hoje mais pobres e como tal, temos que ajustar os nossos gastos.

Nos últimos anos, o estado angolano cresceu muito rapidamente, sem que isso implicasse melhores serviços. As receitas petrolíferas cresceram exponencialmente entre 2002 e 2008 e voltaram a recuperar da crise de 2009 já em 2010 (+49% por barril) e tiveram um desempenho melhor ainda em 2011 (+62% por barril) mas a estagnação de 2012 (-0,7% por barril) e a quebra expressiva em 2013 (-12,1%) não conduziram aos ajustamentos necessários e os funcionários públicos (pelo menos os que ocupam cargos de chefia) continuaram a tratar-se bem, tanto é assim que as despesas com pessoal para 2015 chegaram ao nível da obscenidade se considerarmos a qualidade do serviço que prestam.Está na hora de mostrarem coragem e exercerem algum sentido de nação, há que dar menos leite ao gato gordo e é urgente começar a tomar medidas. Cortar benefícios e viagens é capaz de não chegar. Cortar o 13.º seria uma saída imediata (haverão aí contingências legais) e convém avisar já as pessoas que este ano não haverá cabaz de natal porque o desequilíbrio das contas públicas não só é um facto financeiro como é um “facto matemático”.

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